R.E. ,
abril de 1862, p.
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PERFECTIBILIDADE DA RAÇA NEGRA19, 20
A raça negra é perfectível? Segundo algumas pessoas,esta questão é
julgada e resolvida negativamente. Se assim é, e se esta raça é votada
por Deus a uma eterna inferioridade, segue-se que é inútil nos
preocuparmos com ela e que devemos nos limitar a fazer do negro uma
espécie de animal doméstico, preparado para a cultura do açúcar e do
algodão. Entretanto a Humanidade, tanto quanto o interesse social,
requer um exame mais cuidadoso. É o que tentaremos fazer. Mas como uma
conclusão desta gravidade, num ou noutro sentido, não pode ser tomada
levianamente e deve apoiar-se em raciocínio sério, pedimos permissão
para desenvolver algumas considerações preliminares, que nos servirão
para mostrar,mais uma vez, que o Espiritismo é a única chave possível de
uma multidão de problemas, insolúveis com o auxílio dos dados atuais da
Ciência. A frenologia nos servirá de ponto de partida. Exporemos
sumariamente as suas bases fundamentais para melhor compreensão do
assunto.
19 N. do T.: Vide Revista Espírita, julho de 1860: Frenologia e Fisiognomonia.
20 Nota da Editora: Ver “Nota Explicativa”, p. 529.
Como se sabe, a frenologia apóia-se no princípio de que o cérebro é o
órgão do pensamento, como o coração o é da circulação, o estômago da
digestão e o fígado da secreção da bile. Este ponto é admitido por
todos, pois ninguém há que possa atribuir o pensamento a outra parte do
corpo. Cada um sente que pensa pela cabeça e não pelo braço e pela
perna. Mais ainda: sente-se instintivamente que a sede do pensamento
está na fronte; é aí, e não no occipício, que se leva a mão para indicar
que um pensamento acaba de surgir. Para todo o mundo o desenvolvimento
da parte frontal leva a presumir mais inteligência do que quando ela é
baixa e deprimida. Por outro lado, as experiências anatômicas e
fisiológicas demonstraram claramente o papel especial de certas partes
do cérebro nas funções vitais, e a diferença dos fenômenos produzidos
pela lesão de tal ou qual parte. As pesquisas da Ciência não podem
deixar dúvida a respeito; as do Sr. Flourens, sobretudo, provaram à
evidência a especialidade das funções do cerebelo.
Assim, é admitido como princípio que as diferentes partes do cérebro não
exercem as mesmas funções. Além disso, é reconhecido que, originando-se
do cérebro, os cordões nervosos,tal como os filamentos de uma raiz, se
ramificam em todas as partes do corpo e são afetados de maneira
diferente, conforme a sua destinação. É assim que o nervo óptico, que
alcança o olho e se abre na retina é afetado pela luz e pelas cores e
transmite essas sensações ao cérebro numa porção especial; que o nervo
auditivo é afetado pelos sons, os nervos olfativos pelos odores. Se um
desses nervos perder a sensibilidade por uma causa qualquer, não haverá
mais a sensação: fica-se cego, surdo ou privado do odor. Esses nervos
têm, pois, funções distintas e não podem de modo algum se substituir,
embora o exame mais minucioso não mostre a mínima diferença na sua
contextura.
Partindo desses princípios, a frenologia vai longe: localiza todas as
faculdades morais e intelectuais, atribuindo a cada uma um lugar
especial no cérebro. É assim que confere a um órgão o instinto de
destruição que, levado ao excesso, se torna crueldade e ferocidade; a
outro a firmeza, cujo excesso, sem o contrapeso do julgamento, produz a
obstinação; a outro o amor da progênie; finalmente, a outros, a memória
das localidades, dos números, das formas, do sentimento poético, da
harmonia dos sons, das cores, etc., etc. Aqui não é o lugar de fazer a
descrição anatômica do cérebro. Diremos apenas que, se fizermos uma
secção longitudinal na massa, reconheceremos que da base partem feixes
fibrosos que vão desabrochar na superfície, apresentando mais ou menos o
aspecto de um cogumelo cortado na sua altura. Cada feixe corresponde a
uma das circunvoluções da superfície externa, de onde se segue que o
desenvolvimento da circunvolução corresponde ao desenvolvimento do feixe
fibroso. Sendo cada feixe, de acordo com a frenologia, a sede de uma
sensação ou de uma faculdade, conclui ela que a energia da sensação ou
da faculdade é proporcional ao desenvolvimento do órgão.
No feto a caixa óssea do crânio ainda não se acha formada; inicialmente
não passa de uma película, de uma membrana muito flexível, que se
modela, conseguintemente, nas partes salientes do cérebro e lhes
conserva a impressão, à medida que se endurece pelos depósitos de
fosfato de cálcio, que é a base dos ossos. Das saliências do crânio a
frenologia conclui o volume do órgão, e do volume do órgão conclui o
desenvolvimento da faculdade.
Tal é, em breves palavras, o princípio da ciência frenológica. Embora o
nosso objetivo não seja desenvolvê-la aqui, ainda são necessárias
algumas palavras quanto ao modo de apreciação. Enganar-se-ia
redondamente quem acreditasse poder deduzir o caráter absoluto de uma
pessoa pela simples inspeção das saliências do crânio. As faculdades se
contrabalançam reciprocamente, se equilibram, se corroboram ou se
atenuam umas às outras, de tal sorte que, para julgar um indivíduo, é
preciso levar em conta o grau de influência de cada uma, em razão do seu
desenvolvimento, depois pesar na balança o temperamento, o meio, os
hábitos e a educação.
Suponhamos um homem com o órgão da destruição muito pronunciado, com
atrofia dos órgãos das faculdades morais e afetivas: será miseravelmente
feroz. Mas se à destruição aliar a benevolência, a afeição, as
faculdades intelectuais, a destruição será neutralizada e terá o efeito
de lhe dar mais energia; poderá ser um homem muito honrado, ao passo que
o observador superficial, que o julgasse apenas pela inspeção do
primeiro órgão, o tomaria por um assassino. Concebem-se, assim, todas as
modificações de caráter que podem resultar do concurso das outras
faculdades,como a astúcia, a circunspeção, a auto-estima, a coragem,
etc. A só sensação da cor fará o colorista, mas não fará o pintor; só a
da forma não fará o desenhista; as duas reunidas apenas farão um bom
copista se, ao mesmo tempo, não houver o sentimento da idealidade ou da
poesia, e as faculdades reflexivas e comparativas. Basta isto para
mostrar que as observações frenológicas práticas apresentam grande
dificuldade e repousam sobre considerações filosóficas, que não estão ao
alcance de todos. Estabelecidas estas preliminares, encaremos a coisa
de outro ponto de vista.
Dois sistemas radicalmente opostos dividiram, desde o início, os
frenologistas em materialistas e espiritualistas. Não admitindo nada
fora da matéria, dizem os primeiros que o pensamento é um produto da
substância cerebral; que o cérebro secreta o pensamento, como as
glândulas salivares secretam a saliva,como o fígado secreta a bile. Ora,
como a quantidade de secreção geralmente é proporcional ao volume e à
qualidade do órgão secretor, dizem que a quantidade de pensamentos é
proporcional ao volume e à qualidade do cérebro; que cada parte do
cérebro,secretando uma ordem particular de pensamentos, os diversos
sentimentos e as diversas aptidões estão na razão direta do órgão que os
produz. Não refutaremos esta monstruosa doutrina, que faz do homem uma
máquina, sem responsabilidade por seus atos maus, sem méritos pelas suas
boas qualidades, e que apenas deve o seu gênio e as suas virtudes ao
acaso de sua organização21. Com semelhante sistema toda punição é
injusta e todos os crimes são justificados.
Os espiritualistas dizem, ao contrário, que os órgãos não são a causa
das faculdades, mas os instrumentos da manifestação das faculdades; que o
pensamento é um atributo da alma e não do cérebro; que a alma,
possuindo por si mesma aptidões diversas, a predominância de tal ou qual
faculdade impele o desenvolvimento do órgão correspondente, como o
exercício de um braço induz o desenvolvimento dos músculos desse braço.
Daí se segue que o desenvolvimento de um órgão é o efeito, e não a
causa.
Assim, um homem não é poeta porque tenha o órgão da poesia: ele tem o
órgão da poesia porque é poeta, o que é muito diferente. Mas aqui se
apresenta uma outra dificuldade, ante a qual forçosamente tropeçam os
frenologistas: se for espiritualista, dirá que o poeta tem o órgão da
poesia porque é poeta; mas não nos diz por que ele é poeta, porque o é,
em vez de seu irmão, embora educado nas mesmas condições; e, assim, em
relação a todas as outras aptidões. Só o Espiritismo o explica.
Com efeito, se a alma fosse criada ao mesmo tempo que o corpo, a do
sábio do Instituto seria tão nova quanto a do selvagem. Então, por que
há na Terra selvagens e membros do Instituto? Direis que depende do meio
em que vivem. Seja. Dizei, então, por que homens nascidos nos meios
mais ingratos e mais refratários tornam-se gênios, ao passo que outros,
que recebem a Ciência desde a infância, são imbecis? Os fatos não provam
à evidência que há homens instintivamente bons ou maus, inteligentes ou
estúpidos? É preciso, pois, que haja na alma um 21 Vide a Revista de
março de 1861: A Cabeça de Garibaldi. germe. De onde vem ele? Pode
dizer-se razoavelmente que Deus os fez de todos os tipos, uns chegando
sem esforço e outros nem sequer com um trabalho obstinado? Seria isso
justiça e bondade? Evidentemente, não. Uma única solução é possível: a
preexistência da alma, sua anterioridade ao nascimento do corpo, o
desenvolvimento adquirido conforme o tempo vivido e as várias migrações
percorridas. Unindo-se ao corpo, a alma traz, pois, o que adquiriu, suas
qualidades boas ou más. Daí as predisposições instintivas, de onde se
pode dizer com certeza que aquele que nasceu poeta já cultivou a poesia;
que o que nasceu músico cultivou a música; o que nasceu celerado, já
foi mais celerado. Tal é a fonte das faculdades inatas que produzem, nos
órgãos afetados à sua manifestação, um trabalho interior, molecular,
que provoca o seu desenvolvimento.
Isto nos conduz ao exame da importante questão da inferioridade de certas raças e de sua perfectibilidade.
Antes de mais, admitamos como princípio que todas as faculdades, todas
as paixões, todos os sentimentos, todas as aptidões estão em a Natureza;
que são necessárias à harmonia geral,posto que Deus nada faz de inútil;
que o mal resulta do abuso, assim como da falta de contrapeso e de
equilíbrio entre as diversas faculdades. Porque as faculdades não se
desenvolvem simultaneamente, resulta que o equilíbrio não pode se
estabelecer senão com o tempo; que essa falta de equilíbrio produz os
homens imperfeitos, nos quais o mal domina momentaneamente.
Tomemos para exemplo o instinto da destruição. Ele é necessário porque
na Natureza é preciso que tudo seja destruído para se renovar. Por isso
todas as espécies vivas são, ao mesmo tempo, agentes destruidores e
reprodutores. Mas o instinto de destruição isolado é um instinto cego e
brutal; impera entre os povos primitivos, entre os selvagens cuja alma
ainda não adquiriu qualidades reflexivas próprias a regular a destruição
em justa medida. Numa única existência, poderá o selvagem adquirir as
qualidades que lhe faltam? Seja qual for a educação que lhe derdes desde
o berço, dele fareis um São Vicente de Paulo, um sábio, um orador, um
artista? Não; é materialmente impossível. E, no entanto,o selvagem tem
uma alma. Qual a sorte dessa alma depois da morte? É punida pelos atos
bárbaros que ninguém reprimiu? É colocada em igualdade com o homem de
bem? Um não é mais racional que o outro. É, então, condenada a ficar
eternamente num estado misto, que nem é felicidade, nem infelicidade?
Isto não seria justo, porque se ela não é mais perfeita, não dependeu
dela. Só podeis sair deste dilema admitindo a possibilidade de
progresso. Ora, como pode a alma progredir, a não ser tendo novas
existências? Dir-se-á que poderá progredir como Espírito, sem voltar à
Terra. Mas, então, por que nós, civilizados, esclarecidos,nascemos na
Europa e não na Oceania? em corpos brancos, ao invés de corpos negros?
Por que um ponto de partida tão diferente,se só se progride como
Espírito? Por que Deus nos liberou da longa rota percorrida pelos
selvagens? Seriam nossas almas de natureza diversa das suas? Por que
tentar torná-los cristãos? Se os tornais cristãos, é que os olhais como
vosso igual perante Deus. E se é vosso igual perante Deus, por que Deus
vos concede
privilégios? Por mais que façais, não chegareis a nenhuma solução,a
menos que admitais para nós um progresso anterior e para os selvagens um
progresso ulterior. Se a alma do selvagem deve progredir
posteriormente, é que nos alcançará; se progredimos anteriormente, é que
fomos selvagens, pois se for diferente o ponto de partida, não haverá
mais justiça, e se Deus não for justo, já não será Deus. Eis, pois,
forçosamente, duas existências extremas: a do selvagem e a do homem
ultracivilizado; mas, entre esses dois extremos, não haverá nenhum ponto
intermediário? Segui a escala dos povos e vereis que é uma corrente
ininterrupta, sem solução de continuidade.
Ainda uma vez, todos esses problemas são insolúveis sem a pluralidade
das existências. Dizei que os zelandeses renascerão num povo um pouco
menos bárbaro, e assim por diante até a civilização, e tudo se explica;
que se, em vez de seguir os degraus da escala os transpuser de um salto e
chegar sem transição entre nós, dará o hediondo espetáculo de um
Dumollard, que para nós é um monstro e que nada teria apresentado de
anormal entre os povos da África central, de onde talvez tenha saído. É
assim que, ao nos restringirmos numa existência única, tudo é
obscuridade,tudo é problema sem saída, ao passo que com a reencarnação,
tudo é claridade, tudo é solução.
Voltemos à frenologia. Ela admite órgãos especiais para cada faculdade e
julgamos que esteja certa. Mas vamos mais longe. Vimos que cada órgão
cerebral é formado de um feixe de fibras; pensamos que cada fibra
corresponda a uma nuança de faculdade. Isto não passa de uma hipótese, é
verdade, mas que poderá abrir caminho a novas observações. O nervo
auditivo recebe os sons e os transmite ao cérebro. Mas se o nervo é
homogêneo, como percebe sons tão variados? É, pois, lícito admitir que
cada fibra nervosa é afetada por um som diferente, com o qual, de certo
modo, vibra em uníssono, como as cordas de uma harpa. Todos os tons
estão na Natureza. Imaginemos uma centena deles, do mais agudo ao mais
grave. O homem que possuísse cem fibras correspondentes os perceberia a
todos; o que só possuísse a metade, não perceberia senão a metade dos
sons, pois os outros lhe escapariam e deles não teria nenhuma
consciência. Dá-se o mesmo com as cordas vocais para exprimir os sons,
com as fibras ópticas para a percepção das diversas cores, com as fibras
olfativas para registrar todos os odores. O mesmo raciocínio pode
aplicar-se aos órgãos de todos os gêneros de percepções e de
manifestações.
Todos os corpos animados encerram, incontestavelmente,o princípio de
todos os órgãos; uns, porém, em certos indivíduos, se acham num estado
de tal forma rudimentar que não são susceptíveis de desenvolvimento; é
exatamente como se não existissem. Assim, nessas pessoas, não pode haver
percepções nem manifestações correspondentes a esses órgãos; numa
palavra elas são, para tais faculdades, como os cegos em relação à luz e
os surdos para a música.
O exame frenológico dos povos pouco inteligentes constata a
predominância das faculdades instintivas e a atrofia dos órgãos da
inteligência. Aquilo que é excepcional nos povos avançados é a regra em
certas raças. Por quê? Será uma injusta preferência? Não; é sabedoria. A
Natureza é sempre previdente; nada faz de inútil. Ora, seria inútil dar
um instrumento completo a quem não tenha os meios para dele se servir.
Os Espíritos selvagens são ainda crianças, se assim podemos nos
exprimir. Neles muitas faculdades ainda estão latentes. O que faria o
Espírito de um hotentote no corpo de um Arago? Seria como alguém que
nada sabe de música diante de um piano excelente. Por uma razão inversa,
o que faria o Espírito Arago no corpo de um hotentote? Seria como Liszt
diante de um piano contendo apenas algumas cordas desafinadas, das
quais o seu talento não conseguiria jamais tirar sons harmoniosos. Arago
entre os selvagens, com todo o seu gênio, será tão inteligente quanto o
pode ser um selvagem, e nada mais; jamais será, numa pele negra, membro
do Instituto. Seu Espírito induziria o desenvolvimento dos órgãos?
Órgãos fracos, sim; órgãos rudimentares, não22.
A Natureza, portanto, apropriou os corpos ao grau de desenvolvimento dos
Espíritos que neles devem encarnar; eis por que os corpos das raças
primitivas possuem menos cordas vibrantes que os das raças adiantadas.
Há, pois, no homem dois seres bem distintos: o Espírito, ser pensante; o
corpo, instrumento das manifestações do pensamento, mais ou menos
completo, mais ou menos rico em cordas, conforme as necessidades.
Chegamos agora à perfectibilidade das raças. Por assim dizer, essa
questão é resolvida pela precedente: apenas temos 22 Vide a Revista
Espírita de outubro de 1861: Os cretinos. que deduzir algumas
conseqüências. Elas são perfectíveis para o Espírito que se desenvolve
através de suas várias migrações, em cada uma das quais adquire pouco a
pouco as faculdades que lhe faltam; mas, à proporção que essas
faculdades se ampliam, necessita de um instrumento apropriado, como uma
criança que cresce precisa de roupas maiores. Ora, sendo insuficientes
os corpos constituídos para o seu estado primitivo, necessitam encarnar
em melhores condições, e assim por diante, à medida que progridem.
Assim, as raças são perfectíveis pelo corpo, pelo cruzamento com raças
mais aperfeiçoadas, que trazem novos elementos, aí enxertando, por assim
dizer, os germes de novos órgãos. Esse cruzamento se faz pelas
migrações, as guerras e as conquistas. Sob esse ponto de vista, há
raças, como há famílias, que se abastardam, se não misturarem sangues
diversos. Então não se pode dizer que haja raça primitiva pura,
porquanto, sem cruzamento, essa raça será sempre a mesma, pois seu
estado de inferioridade se prende à sua natureza; degenerará, em vez de
progredir, o que resultará no seu desaparecimento, ao cabo de certo
tempo.
Diz-se a respeito dos negros escravos: “São seres tão brutos, tão pouco
inteligentes, que seria trabalho perdido querer instrui-los. É uma raça
inferior, incorrigível e profundamente incapaz.” A teoria que acabamos
de dar permite encará-los sob outra luz. Na questão do aperfeiçoamento
das raças, deve-se sempre levar em conta dois elementos constitutivos do
homem: o elemento espiritual e o elemento corporal. É preciso conhecer
um e outro, e só o Espiritismo nos pode esclarecer sobre a natureza do
elemento espiritual, o mais importante, por ser o que pensa e que
sobrevive, enquanto o elemento corporal se destrói.
Assim, como organização física, os negros serão sempre os mesmos; como
Espíritos, trata-se, sem dúvida, de uma raça inferior23, isto é,
primitiva; são verdadeiras crianças às quais muito pouco se pode
ensinar. Mas, por meio de cuidados inteligentes é sempre possível
modificar certos hábitos, certas tendências, o que já constitui um
progresso que levarão para outra existência e que lhes permitirá, mais
tarde, tomar um envoltório em melhores condições. Trabalhando em sua
melhoria, trabalha-se menos pelo seu presente que pelo seu futuro e, por
pouco que se ganhe, para eles é sempre uma aquisição. Cada progresso é
um passo à frente, facilitando novos progressos.
Sob o mesmo envoltório, isto é, com os mesmos instrumentos de
manifestação do pensamento, as raças são perfectíveis somente em
estreitos limites, pelas razões que desenvolvemos. Eis por que a raça
negra, enquanto raça negra, corporalmente falando, jamais atingirá o
nível das raças caucásicas; mas, na qualidade de Espírito, é outra
coisa: pode tornar-se e tornar-se-á aquilo que somos. Apenas necessitará
de tempo e de melhores instrumentos. Por isso as raças selvagens, mesmo
em contato com a civilização, permanecerão sempre selvagens; porém, à
medida que as raças civilizadas se espalham, as selvagens diminuem, até
desaparecerem completamente, como aconteceu com a raça dos Caraíbas, dos
Guanches e outras. Os corpos desapareceram; quanto aos Espíritos, em
que se transformaram? Muitos deles, talvez, se encontrem entre nós.
Já dissemos e vamos repetir: o Espiritismo descortina novos horizontes a
todas as ciências. Quando os cientistas levarem em consideração o
elemento espiritual nos fenômenos da Natureza, ficarão surpresos de ver
que as dificuldades contra as quais tropeçam a cada passo são removidas
como por encanto. Mas é provável que, para muitos, seja necessário
renovar o hábito. 23 N. do T.: Allan Kardec, por certo, está se
referindo aos Espíritos encarnados nas tribos incultas, selvagens, então
existentes em algumas regiões do planeta e que hoje, em contato com
outros pólos de civilização, vêm evoluindo progressivamente, como sói
acontecer com as demais raças, seja qual for a coloração de sua pele.
Quando voltarem, terão tido tempo de refletir e trarão novas idéias.
Acharão as coisas muito mudadas aqui na Terra; as idéias espíritas,que
hoje repelem, terão germinado por toda parte e serão a base de todas as
instituições sociais. Eles próprios serão educados e sustentados nessa
crença, que abrirá ao seu gênio novo campo para o progresso da ciência.
Enquanto esperam, e enquanto aqui ainda se encontram, procuram a solução
do problema: Por que a autoridade de seu saber, e suas negativas, não
detêm, sequer por um instante, a marcha cada dia mais rápida das idéias
novas?