sábado, 4 de julho de 2009

Notícia: "Pílulas para aborto em bocas de fumo"



Remédio proibido é vendido por traficantes para jovens grávidas por dez vezes o valor de mercado. - Francisco Édson Alves e Pâmela Oliveira

Rio - Traficantes do Rio estão vendendo nas bocas de fumo, por até dez vezes mais que o preço médio de mercado, o comprimido Cytotec, proibido no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O medicamento — indicado para o tratamento de úlcera, mas usado em larga escala como abortivo — chega a ser vendido por R$ 50 a unidade de 25mg nos pontos de vendas de maconha e cocaína. Cada comprimido da substância misoprostol, fornecida pela Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil com outro nome comercial exclusivamente para hospitais que têm autorização para usá-la, é comprado pelo governo por R$ 5,43. A denúncia chegou ao deputado federal Otávio Leite, como noticiou o Informe do DIA na semana passada. O parlamentar encaminhará ofício ao secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, pedindo “investigação rigorosa”.


A comercialização de Cytotec por traficantes do Rio é confirmada por funcionários de uma das maiores maternidades públicas da Zona Norte: a Herculano Pinheiro, em Madureira. A direção da instituição foi proibida de falar sobre o assunto pela Secretaria Municipal de Saúde. De acordo com uma médica do hospital, porém, que pediu para não ser identificada, das cerca de 70 mulheres internadas mensalmente para curetagem uterina — procedimento em que o útero é raspado para retirada de material infeccioso —, metade relata ter usado Cytotec para provocar aborto.

A jovem A., que comprou o remédio numa favela,
diz não ter condição de criar outro filho.

“A maioria das cerca de 35 mulheres é formada por adolescentes que querem interromper a gravidez indesejada. Elas contam que conseguiram o abortivo com traficantes, pagando, em média, R$ 50”, ressalta a médica.

"Não suportei a dor e tive que ir ao hospital - B., mulher que usou Cytotec"

De acordo com ela, o número de jovens que compram o medicamento nos locais onde se vende também maconha, cocaína e crack pode ser bem maior. “Quando as adolescentes chegam a procurar a maternidade, já estão com sangramento e infecções, correndo até risco de vida. Muitas acabam comprando ‘gato por lebre’. Ou seja, são enganadas com medicamento com fórmula falsificada”, alerta a médica.

Além de pedir atenção maior da polícia, Otávio Leite também promete levar o assunto ao conhecimento do governo federal. “A situação é gravíssima. Esta semana mesmo vou ocupar a tribuna da Câmara para falar sobre isso. As autoridades e a sociedade têm que se mobilizar para impedir o avanço desse absurdo”, afirmou Leite, acrescentando que o Cytotec estaria sendo vendido em favelas de Madureira como Cajueiro, Grota, Serrinha, Congonhas e São José. Nesses locais, o controle do tráfico é dividido entre as facções criminosas Comando Vermelho (CV) e Amigos dos Amigos (ADA).

Em fevereiro do ano passado, policiais da Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Saúde Pública iniciaram investigações sobre venda de Cytotec. Na época, durante a Operação Hércules, foram presos 12 integrantes de bando que contrabandeava e vendia anabolizantes e remédios proibidos e falsificados — entre eles o Cytotec — em academias, farmácias e clínicas estéticas. Na ocasião, a polícia obteve pistas de que parte dos medicamentos vendidos ilegalmente tinha sido desviada da rede pública ou roubada de farmácias. Boa quantidade do abortivo foi apreendido.

DESESPERO E DOR

Aos 21 anos, a jovem A. usou Cytotec. Mãe de um menino e sem condições de criar mais um, a jovem conta que comprou o remédio numa favela. “Quando soube que estava grávida, fiquei desesperada. Não tinha dinheiro para fazer o aborto numa clínica. A pessoa que me vendeu explicou que deveria tomar dois e colocar dois na vagina. Foi a pior dor que já senti na vida. Achei que ia morrer”, relata a moça, que depois de passar dias com forte hemorragia foi obrigada a buscar socorro em um hospital público. “Contei que tinha tomado Cytotec porque tive medo de morrer. Tive medo de ser denunciada, mas não podia mentir para o médico”, contou.

Segundo o Ministério da Saúde, por ano cerca de 200 mil mulheres são internadas nos hospitais públicos para se submeter a curetagem pós-aborto. No estado do Rio, 13.342 foram internadas entre janeiro e novembro de 2008.

Quarta causa de morte materna

Chás, sondas, objetos perfurantes e líquidos cáusticos, que na década de 80 eram as ‘técnicas’ mais utilizadas pelas mulheres que se submetiam a abortos, foram substituídas pelo uso do remédio Cytotec nos anos 90, segundo um estudo do Ministério da Saúde.

“Os abortos clandestinos são um problema de saúde pública grave. Essa é quarta causa de morte materna no País — perde apenas para complicações causadas por hipertensão, hemorragias e infecções”, afirma Lena Peres, coordenadora da área de Saúde da Mulher do ministério.

O trabalho, que reuniu pesquisas sobre aborto durante 20 anos no Brasil, mostra ainda que a interrupção da gravidez não é um fenômeno adolescente. “O perfil da mulher que faz aborto é: casada, com idades entre 20 e 30 anos e católica”, afirma. O estudo indica que a compra do abortivo é geralmente feita por um homem.

Estado já é grave ao buscar socorro

O medo de serem descobertas cometendo um crime faz com que muitas mulheres que usam o Cytotec cheguem aos hospitais já em estado grave, depois de perder muito sangue, às vezes por mais de um dia. O problema tem sido constatado no Hospital Geral de Bonsucesso, onde os médicos notaram o aumento de pacientes que recorrem ao método.

“Elas chegam ao hospital com dores e sangramentos intensos. Muitas vezes já em estado grave depois de ter hemorragia por mais de um dia devido ao remédio. Sem dúvida, essa demora para recorrer ao atendimento faz com que aumente o risco”, conta a médica Elisabeth Cristina Maria Teixeira, chefe da obstetrícia no hospital. “Já houve casos de mulheres que chegaram com choque hipovolêmico, resultado de hemorragias intensas, colocando em risco a própria vida”, afirma.

Sem coragem de admitir o uso do Cytotec, muitas relatam que levaram um tombo e perderam o bebê. Em algumas unidades de saúde, fala-se que a paciente é vítima de ‘tombotec’, uma referência ao uso de Cytotec escondido sob a desculpa de um tombo. “Elas não contam, mas o médico, no exame ginecológico, acha o remédio”, diz Elisabeth.

Fonte: http://odia.terra.com.br/portal/rio/html/2009/6/pilulas_para_aborto_em_bocas_de_fumo_15244.html#nogo

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Comentário

Os traficantes encontraram mais uma maneira de vender drogas, pois que os remédios também são drogas - a diferença está no que é lícito ou ilícito. Sendo proibido, sempre vai aparecer alguém para atender a demanda, seja do que for, independente das razões da proibição, e sempre vai aparecer alguém suficientemente insano ou ingênuo para manter esse famigerado mercado.
O Cytotec, assim como a "pílula do dia seguinte", tem um único fim: dar uma solução rápida e "secreta" para a inconsciência, a falta de amor próprio, a falta de responsabilidade, o descuido consigo mesmo, enfim, a falta de juízo, como diria minha avó.
E o pior é que são justamente os jovens, as jovens mulheres principalmente, que estão consumindo essas drogas; pessoas de quem se espera que seja esperto, atento, antenado... será?

Bjks da Elo

(Eloci Mello é membro da Equipe do CVDEE)

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