domingo, 10 de março de 2013

Revista Espírita: Conversas familiares de alémtúmulo


Revista Espírita
Jornal de Estudos Psicológicos
Segundo Ano 1859
Julho
 
Sociedade Parisiense de Estudos
Espíritas.
 
Boletim da Sociedade Parisiense
de Estudos Espíritas
 
Revista Espírita, julho de 1859
 
Publicaremos no futuro o comentário regular das sessões da Sociedade. Contávamos fazê-lo a partir deste número, mas a quantidade de matérias nos obrigou a adiá-lo para a próxima entrega. Os Sócios que não residem em Paris, e os membros correspondentes, poderão assim seguir os trabalhos da Sociedade. Limitar-nos-emos a dizer hoje que, apesar da intenção do que o senhor Allan Kardec havia expressado em seu discurso de encerramento de renunciar à presidência, quando da renovação da secretaria, ele foi reeleito por unanimidade com uma abstenção e um voto em branco. 

Acreditaria mal responder a um testemunho assim elogioso persistindo em sua recusa. Ele não aceitou, todavia, senão condicionalmente e sob a reserva expressa de renunciar às suas funções no momento que a Sociedade se encontrasse em condições de oferecer a presidência a uma pessoa cujo nome e posição social fossem de natureza a dar-lhe um maior relevo; sendo seu desejo poder consagrar todo o seu tempo aos trabalhos e aos estudos que ela demanda.
   
Conversas familiares de alémtúmulo
 
Revista Espírita, julho de 1859
 
NOVIDADES DA GUERRA
 
O governo permitiu aos jornais, apolíticos darem notícias da guerra, mas como as relações são muitas sob todas as formas, seria ao menos inútil repeti-las aqui. O que talvez fosse mais novo para os nossos leitores é uma narração chegada do outro mundo; embora não seja tirada da fonte oficial do Moniteur, não deixa de oferecer interesse do ponto de vista dos nossos estudos. Pensamos, pois, interrogar algumas das gloriosas vítimas da vitória, presumindo que poderíamos encontrar nisso alguma instrução útil; tais objetos de observação e sobretudo da atualidade não se apresentam todos os dias. Não conhecendo, pessoalmente, nenhum daqueles que tomaram parte na última batalha, pedimos aos Espíritos que consentem em nos assistir, se gostariam de nos enviar um deles; pensamos mesmo encontrar, num estranho, mais liberdade e facilidade do que se fora em presença de amigos ou de parentes, dominados pela emoção. Com a resposta afirmativa, tivemos as entrevistas
seguintes.
 
O Soldado Argelino de Magenta.
 
PRIMEIRA ENTREVISTA. (Sociedade, 10 de junho de 1859.)

1. Rogamos a Deus Todo-poderoso permitir ao Espírito de um dos militares mortos na batalha de Magenta comunicar-se conosco. - R. Que quereis saber?
2. Onde estáveis quando vos chamamos? - R. Não sei dize-lo.
3. Quem vos preveniu que desejávamos conversar convosco? - R. Um que é mais esperto do que eu.
4. Em vossa vida duvidáveis que os mortos poderiam vir conversar com os vivos? - R. Oh! disso, não.
5. Que efeito isso produziu sobre vós ao vos encontrardes aqui? - R. Deu-me prazer; deveis, pelo que me dizem, fazer grandes coisas.
6. A qual corpo da armada pertencíeis? (Alguém disse em voz baixa: Pela sua linguagem deve ser um zuavo.) - R. Ah! Vós o dissestes.
7. Que grau tínheis? - R. O de todo mundo.
8. Como vos chamáveis? - R. Joseph Midard.
9. Como morrestes? - R. Gostaríeis de tudo saber e de nada pagar.
10. Vamos! Perdestes vossa alegria; dizei sempre, nós pagaremos depois. Como morrestes? - R. Por uma ameixa carregada.
11. Ereis contrário a ser morto? - R. Minha fé! Não; estou bem aqui.
12. No momento em que morrestes, imediatamente vos reconhecestes? - R. Não, estava tão atordoado que não o acreditava.



Nota. Isto está conforme tudo o que observamos nos casos de morte violenta; o Espírito, não se rendendo conta de sua situação, não crê imediatamente estar morto. Esse fenômeno se explica muito facilmente; ele é análogo ao do sonâmbulo que não crê dormir. Com efeito, para o sonâmbulo, a idéia do sono é sinônimo de suspensão das faculdades intelectuais; ora, como pensa, para ele não dorme; disso não se convence senão mais tarde, quando estiver familiarizado com o sentido ligado a essa palavra. Ocorre o mesmo com o Espírito surpreendido por uma morte súbita, quando nada havia preparado sua separação do corpo; para ele a morte é sinônimo de destruição, de aniquilamento; ora, como vê, sente-se, tem suas idéias, para ele não está morto; é necessário algum tempo para se reconhecer.
13. No momento que morrestes, a batalha não tinha terminado; seguistes suas peripécias? - R. Sim, uma vez que disse que não me acreditava estar morto; eu queria sempre ir de encontro aos outros cães.
14. Que sensação experimentastes nesse momento? - R. Estava encantado, achava-me muito leve.
15. Víeis os Espíritos de vossos companheiros deixarem seus corpos? - R. Não me ocupava disso, uma vez que eu não acreditava na morte.
16. Em que se tornava nesse momento essa multidão de Espíritos deixando a vida no tumulto da refrega? - R. Creio que faziam como eu.
17. Os Espíritos daqueles que se batiam com mais ardor, uns contra os outros, que pensavam encontrando-se juntos nesse mundo dos Espíritos? Estavam ainda animados uns contra os outros? -R. Sim, durante algum tempo e segundo o seu caráter.
18. Reconheceis-vos melhor agora? - R. Sem isso não me teriam enviado aqui.
19. Poderíeis dizer-nos se entre os Espíritos mortos há muito tempo, encontravam-se ali os que se interessavam pela sorte da batalha? (Pedimos a São Luís consentir ajudá-lo em suas respostas, a fim de que sejam tão explícitas quanto possível para a nossa instrução). - R. Em uma grande quantidade, porque é bom que sabeis que esses combates e suas conseqüências estão preparados de longa data, e que nossos adversários não estão enlameados de crimes, como o fizeram sem serem impelidos tendo em vista conseqüências futuras, que não tardareis a saber.
20. Deveria haver aí quem se interessasse pelo sucesso dos Austríacos; isso formava dois campos entre eles? - R. Evidentemente.

Nota. - Não nos parece ver aqui os deuses de Homero tomando partido uns pelos Gregos, e os outros pelos Troianos? Quem eram, com efeito os deuses do paganismo, senão Espíritos dos quais os Antigos fizeram divindades? Não tínhamos razão em dizer que o Espiritismo é uma luz que iluminará mais de um mistério, a chave de mais de um problema?
21. Eles exerciam uma influência qualquer sobre os combatentes? - R. Uma muito
considerável.
22. Poderíeis descrever-nos a maneira pela qual exerciam essa influência? - R. Do mesmo modo que todas as outras influências produzidas pelos Espíritos sobre os homens.
23. Que pensais fazer agora? - R. Estudar mais do que o fiz durante a minha última etapa.
24. Ides retornar para assistir, como espectador, aos combates que ainda se travam? - R. Não sei ainda; tenho afeições que me retêm neste momento; entretanto, conto escapar um pouco, de tempo ao outro, para me divertir vendo as brigas subseqüentes.
25. Qual gênero de afeições vos retêm? - R. Uma velha mãe enferma e sofredora, que me chora.
26. Peço perdão pelo mau pensamento que passou pelo meu espírito a respeito da afeição que vos retém. - R. Não o quero mais assim; disse-vos bobagens para vos fazer rir um pouco; é natural que não me tomeis por uma grande coisa, tendo em vista o honorável corpo ao qual pertenceis; mas tranqüilizai-vos: eu não me empenhei senão por essa pobre mãe; mereço um pouco que me tenham mandado para junto de vós.
27. Quando estáveis entre os Espíritos, ouvíeis o ruído da batalha; víeis as coisas tão
claramente quanto durante a vossa vida? -R. Primeiro perdi a visão, mas depois de algum tempo já via muito melhor, porque via todas as astúcias.
28. Pergunto se percebíeis o ruído do canhão. - R. Sim.
29. No momento da ação, pensáveis na morte e no que vos tornaríeis se fosses morto? - R. Pensava no que se tornaria minha mãe.
30. Era a primeira vez que íeis ao fogo? - R. Não, não; e a África?
31. Vistes a entrada dos Franceses em Milão? - R. Não.
32. Sois o único que morreu na Itália? - R. Sim.
33. Pensais que a guerra durará muito tempo? - R. Não; é fácil, e pouco meritório, de resto, predizê-lo.
34. Quando vedes, entre os Espíritos, um de vossos chefes, o reconheceis ainda como vosso superior? - R. Se o é, sim; se não, não.

Nota. - Na sua simplicidade e seu laconismo, essa resposta é eminentemente profunda e filosófica. No mundo espírita, a superioridade moral é a única que se reconhece; aquele que não a tinha na Terra, qualquer que fosse sua classe, não tem nenhuma superioridade; ali, o chefe pode estar abaixo do soldado, o senhor abaixo do servidor. Que lição para o nosso orgulho!

35. Pensais na justiça de Deus, e vos inquietais com ela? - R. Quem não pensaria nela? Mas, felizmente, não tenho que temê-la sempre; resgatei, por algumas ações que Deus achou boas, algumas escapadelas que fiz na qualidade de zuavo, como dissestes.
36. Assistindo a um combate, poderíeis proteger um de vossos companheiros e afastar dele um golpe fatal? - R. Não; isso não está em nosso poder; a hora da morte é marcada por Deus; se deve passar por ela, nada pode impedi-la; como nada pode atingi-lo se a aposentadoria não soou para ele.
37. Vedes o general Espinasse? - R. Não o vi ainda, mas espero muito ainda vê-lo.

Texto retirado do: www.espirito.org.br 

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