Livro em estudo: Nos Bastidores da Obsessão – Editora FEB -
1970
Autor: Espírito Manoel Philomeno de Miranda, psicografia de
Divaldo Pereira Franco
A018
– Cap. 5 – Elucidações valiosas – Segunda Parte
Conforme planejado, reencontramo-nos na sala singela do
socorro espiritual os que participavam da assistência ao irmão Guilherme,
conduzidos por Saturnino e os seus auxiliares. Embora parte considerável dos
presentes fosse constituída de encarnados parcialmente desprendidos pelo sono,
registrava-se em todos uma lucidez espiritual bem expressiva, o que facilitava
o labor dos Benfeitores.
Guilherme, anestesiado pelo sono hipnótico, fora trazido
antes e, no mesmo compartimento, assistido por dois enfermeiros da Esfera
Maior, jazia inconsciente, velado, todavia, pelo carinho que lhe era
indispensável para apaziguar as forças desconexas da ira e da decepção que lhe
martelavam o espírito rebelde e infeliz.
Após aplicados recursos magnéticos de despertamento em
todos os desprendidos parcialmente pelo sono físico, para melhor lucidez
(lucidez relativa de que deveriam estar possuidos os encarnados para as tarefas
em programa, como explicou o Instrutor), e quando todos nos encontrávamos com
melhores possibilidades de registro nos centros perispirituais, elucidou
Saturnino que, naquela oportunidade, fora planejada uma incursão aos domínios
do Dr. Teofrastus, para coleta de informes seguros, no que tangia ao processo
de desobsessão dos membros da família Soares, e, mais em particular, de
Mariana. Expondo quanto ao imperativo do equilíbrio e da manutenção do estado
de oração, equivalente à vigilância e à fé, informou que somente ele, Ambrósio,
Guilherme, o irmão Glauco — que já conhecíamos desde a ocasião da mensagem
sobre Hipnotismo, que tanto nos sensibilizara —, Petitinga e nós seguiríamos às
observações no Anfiteatro enquanto os demais assistentes espirituais e o médium
Morais ali se demorariam em leitura evangélica e oração, contribuindo, desse
modo, para os resultados almejados.
Despertado Guilherme e esclarecido quanto ao programa em
pauta, este não se pôde furtar a uma expressão de horror.
— Como se atreverão a adentrar-se no reduto do Chefe? Quais
os objetivos que levarão em mente? — inquiriu, assombrado. — Ignoram que o
espetáculo terá a direção pessoal do Dr. Teofrastus, que se faz acompanhar
invariavelmente de mais de uma vintena de cooperadores e guardas pessoais? Essa
temeridade poderá redundar em lamentável punição para todos, inclusive eu. Não,
ninguém intente a realização de idéia tão louca quanto essa. Recuso-me
terminantemente à aquiescência.
— Você, no entanto, meu amigo — retrucou Saturnino —, não
se encontra em posição de escolha. As forças hipnológicas ali aplicadas não são
a nós outros desconhecidas. Dispomos de larga experiência na questão e nos
faremos acompanhar de um técnico em recursos que tais, como eficiente
cooperador para qualquer circunstância menos feliz. Além disso, estamos a
serviço de Jesus-Cristo, o Supremo Chefe da Terra, e poder algum é superior às
forças que Ele nos outorga para a prática do bem e a libertação de consciências
ainda mergulhadas nas sombras do crime.
Após uma pausa necessária, em que Guilherme se debatia
entre as lembranças dos pensamentos que lhe eram habituais e a nobre
austeridade de Saturnino, que embora amoroso sabia conduzir a questão com a
energia que não permitia discussão, prosseguiu:
— Como já lhe informamos, o nosso desejo é ajudá-lo a
encontrar a diretriz da paz interior...
— Recuso-a — bradou colérico. — Sinto-me perfeitamente
feliz e a realização dos meus planos é o coroamento de todos os meus esforços e
sofrimentos. Esta imposição desagradável e coercitiva me surpreende e enfurece.
Não conte comigo.
Como se aguardasse a explosão da revolta, Saturnino
acercou-se do revel e, orando em silêncio, se foi transfigurando diante de
todos nós, enquanto uma aura de safirina e profusa claridade o envolvia. Vibrações
sublimes a todos nos dominavam. Tínhamos a impressão de que o reduto modesto se
transformava em recinto de luz. Suave música chegava de longe e,
surpreendentemente, começamos a ver, além do que seriam as paredes materiais,
diversas Entidades Espirituais que participavam das tarefas, embora sem que
nós, os encarnados, soubéssemos, mergulhadas em profunda oração, ajudando
Saturnino que se nos afigurava, agora, veneranda figura ancestral ressurgida
das páginas comovedoras da Boa Nova, nos seus primeiros séculos na Terra,
quando homens afervorados se deixavam vencer pelas feras, em inolvidáveis
testemunhos de amor a Jesus...
As lágrimas nos aljofravam abundantes e ignotas emoções nos
venciam docemente.
O Mensageiro da Vida envolveu Guilherme paternalmente,
transmitindo-lhe os suaves recursos do reconforto e da esperança, e falou-lhe
com inimitável tom de voz:
— Meu filho, Jesus é Vida, e a vida é inevitável caminho de
todos nós, viandantes da evolução. Ninguém se furtará indefinidamente ao
progresso, ao amor, à felicidade que a todos nós estão reservados. Só existe,
soberana, no Universo, a Lei do Amor que rege os mundos e comanda todas as
manifestações existentes, porque o Nosso Pai é o Amor, O ódio a que muitos nos
entregamos, quando inermes caímos na rebeldia, ódio sempre transitório, resulta
da ausência do amor que entorpecemos e envenenamos com as emanações mefíticas
do nosso desequilíbrio. Não receie, portanto, amar. O amor oferece felicidade a
quem ama, produzindo no espírito emoções transcendentes que o enobrecem e
vitalizam. Enquanto o ódio desagrega, macera e enlouquece, o amor sublima e
liberta... Os que desrespeitam as Leis da Harmonia sofrem-lhes as
consequências, sem que nos convertamos nos seus justiçadores, tornando-nos,
igualmente, celerados. E ninguém fruirá de paz ou experimentará alegria,
vitimado em si mesmo pelo ódio. Há aqueles que na volúpia do desequilíbrio
dizem não se importarem com o próprio estado... Todavia, a realidade é outra.
Lucigênitos, temos todos a destinação da Luz Divina...
Silenciou, momentaneamente, para dar ensejo a que Guilherme
se impregnasse das sutis vibrações, deixando-se penetrar pelos argumentos e
pelo amor que dele se irradiava.
Prosseguindo, acrescentou:
— Esqueça, filho, todo o mal, para lembrar-se do infinito bem
com que Nosso Pai nos felicita as horas. O mal somente faz mal a quem o
pratica, tornando-o mau. O perdão que se doa é semente de misericórdia que
lançamos na direção do futuro, a benefício próprio... Não recalcitre. Não adie
a oportunidade da renovação. A vida a todos nos aguarda com a ação benigna ou
severa com que nos conduzirmos em relação ao nosso próximo. Verdadeiramente
infeliz é aquele que não perdoa, não olvida o mal, não oferece oportunidade de
redenção. Todo perseguido resgata e se liberta, enquanto o verdugo se amarra à
dívida e se deixa arrastar aos vigorosos potros do sofrimento, vencido, mais
tarde, pelos vírus que alimentar nos escaninhos da mente atormentada. Recorde,
desse modo, Jesus, que não carregava nenhuma culpa, e no entanto...
O ex-obsessor de Mariana, dominado por súbita emotividade,
prorrompeu em copioso pranto, no qual extravasava toda a angústia retida por
longos decênios, causando compaixão a todos nós, que acompanhávamos o labor
socorrista, valorizando o poder incomparável do amor.
Encolhido nos braços generosos de Saturnino, parecia uma
criança muito crescida, porém absolutamente vulnerável. Cessada a ira, que é
verdugo cruel, o espírito se deixara descontrair, retomando a condição dele
mesmo.
— Chore, filho — acentuou, igualmente comovido, Saturnino.
— As lágrimas de justo arrependimento e de necessária dor são como chuva
preciosa em terra crestada, oferecendo a oportunidade para que medrem as
sementes da esperança e da paz, que padecem, até então, esmagadas na
esterilidade do solo. Não permita, no entanto, que o pranto refazente se
transforme em tormenta ululante e destruidora... Agora começa vida nova para
você, para todos nós. Jesus é sempre a porta, a nova oportunidade. Vadeemos os
rios das paixões que nos retêm e avancemos na direção do porvir promissor. Se o
passado se nos afigura fantasma que nos impossibilita a paz, o futuro, através
da utilização do presente, em sabedoria e nobreza, nos enseja a bênção da
alegria e a dádiva da paz. Todos nos encontramos enleados em reminiscências
dolorosas. O nosso «Ontem» é qual sombra esperando o sol do «hoje» para a
perene claridade do amanhã...
Silenciando, momentaneamente, o Benfeitor Espiritual
parecia recordar longínquas lembranças, e, tomado por sublime modulação que nos
parecia ter origem em distantes sítios, prosseguiu:
— Diante dos infelizes, o Mestre vez alguma teve palavras
de aspereza: não os reprochou, nem os acicatou. Envolveu-os, todos, na
cariciosa esperança de melhores horas, oferecendo-lhes a dádiva do trabalho,
nas oportunidades de mil recomeços para o burilamento íntimo. No entanto,
diante dos que se compraziam na miséria alheia, pseudodominadores do mundo
efêmero, aplicou o corretivo da palavra severa, advertindo-os com singular
austeridade, não os poupando ao peso das responsabilidades que preferiam
.......
«Raros, porém, temos sabido valorizar o impositivo da
informação cristã. A diretriz evangélica, ainda hoje, parece a muitos
«loucura», conforme informava o apóstolo Paulo, em seu tempo. «Tudo nos fala do
amor, desde as paisagens felizes da Natureza às emoções superiores da vida; das
sensações primitivas nos seres inferiores às expressões de felicidade nos
homens... Todavia, o amor, para muitos de nós, não passa de arrematado egoísmo,
no qual asfixiamos as esperanças dos outros nas redes estreitas e apertadas do
nosso personalismo infeliz...»
Relanceou o olhar pela sala clareada fortemente pelas
fulgurações que dele irradiavam, enquanto Guilherme, que buscava assimilar as
lições com expressão de compreensível surpresa e ansiedade, se transformava em
«homem novo», abandonando a carcaça sofrida do «homem velho» imanado ao ódio,
agora renovado pelas sucessivas vibrações do amor. E como se desejasse fixar em
todos nós os conceitos ali emitidos, continuou, lúcido:
— Nascemos, vivemos no corpo e perdemos a indumentária,
retornando ao palco das mesmas lutas, vezes inúmeras, sem conseguirmos melhorar
as condições espirituais, repetindo a «roda das paixões» escravizantes em que
nos comprazemos. Muitos, em incontável número, entramos na carne e dela saímos
sem nos apercebermos do fenômeno, aferrados às vibrações mais primárias da
vida. Todos sonhamos com os Céus, sim. Raros, todavia, estamos construindo as
asas da evolução com os materiais da iluminação íntima, nas linhas severas do
trabalho fraterno, da renúncia, da caridade e do perdão. Semeamos pouca luz e
colhemos aflições danosas; por essa razão, nossa arca de esperança permanece
vazia de alento.
«Sejamos prudentes, pois, utilizando os recursos da hora
presente a benefício próprio.
«Verdadeiramente felizes são aqueles que perdoam, que
cedem, que doam, doando-se, também.
«Jesus é ainda e sempre a nossa lição viva, o nosso exemplo
perene. Busquemo-Lo !»
Silenciou, invadido por emoções transcendentes. Tínhamos a
impressão de encontrar-nos em outro plano vibratório, que não a Terra, nossa
genitora sofrida e portadora de sofrimentos.
Recompondo-se com as características habituais, disse a
Guilherme, que o fitava, algo atoleimado:
— E agora, filho, está disposto a seguir conosco ao recinto
das experiências do irmão Teofrastus?
— Sim. Tenho medo, porém. Em toda a minha desdita, sonhei,
não poucas vezes, com a paz longínqua...
As lágrimas impediram-no de prosseguir.
Pondo-lhe a destra sobre a cabeça banhada de úmido suor,
Saturnino estimulou-o:
— Este é o seu momento de libertação. Não o adie. O Senhor
nos ajudará. Sigamos!
QUESTÕES PARA ESTUDO
1 – Dando continuidade aos trabalhos
espirituais, parte dos benfeitores irá se descolar para o Anfiteatro levando
Guilherme, o espírito obsessor. No entanto, ele se recusa a ir e não quer que
os benfeitores também vão. Por quê?
2 – “Verdadeiramente infeliz é aquele que
não perdoa, não olvida o mal, não oferece oportunidade de redenção.” Comente a
afirmação.
3 – Saturnino transfigura-se em benfeitor
de Luz para convencer Guilherme a lhe acompanhar na excursão ao Anfiteatro,
através de emocionantes palavras. O que podemos retirar de suas palavras e da
forma como foram ditas para a nossa prática no diálogo com os desencarnados
infelizes?
Bom estudo a
todos!!
Equipe Manoel
Philomeno
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