Livro em
estudo: Nos Bastidores da Obsessão – Editora FEB - 1970
Autor:
Espírito Manoel Philomeno de Miranda, psicografia de Divaldo Pereira Franco
A031 – Cap. 12 – Desobsessão e responsabilidade – Parte 1
As lutas
prosseguiram contínuas e intensas. Amparados, todavia, pela Misericórdia
Divina, empenhávamo-nos, igualmente, em corresponder à confiança da Espiritualidade
Superior. Certo é que o carvalho enrija fibras sob as agressões da
tempestade... Também, nós outros, fortificávamo-nos na fé e no entusiasmo à
medida que se multiplicavam os convites à árdua batalha da fidelidade ao dever
espontaneamente assumido. Aqui era o irromper das paixões demoradamente
subordinadas à vontade tentando desequilíbrio; ali eram as investidas da
violência, através de pessoas irresponsáveis que se faziam dóceis instrumentos
dos Espíritos infelizes: parentes invigilantes e perturbados atiçando
rebeldia; almas afeiçoadas pelos estreitos laços do matrimônio, inconsequentes,
ensejando redobrada aflição, feridos pelas farpas do ciúme, da ira e da
insensatez, transformando-se em algozes brutais...
Resistindo quanto nos facultavam
as forças, inspirados e socorridos como estávamos, sentíamos, simultaneamente,
a rara felicidade de nos encontrarmos nos campos da fé redentora. Evocávamos
os mártires dos primeiros tempos do Cristianismo e exultávamos. Se agora a
arena desaparecera dos sítios em que tinha sua construção, estendera limites,
porém, partindo do mundo interior de cada um até às longes partes do
pensamento... Ontem, o holocausto e o martírio público eram estímulo ao
prosseguimento, e o sangue derramado se convertia em adubo nas raízes da fé
nascente. Agora, não. Os testemunhos deveriam ser silenciosos, na cruz da
abnegação e da renúncia, fora dos grandes espetáculos...
Transcorriam os dias sem outras
alterações, quando, no trabalho habitual de intercâmbio mediúnico, Saturnino
elucidou que o irmão Glaucus viria à incorporação pelo médium Morais, para
instruções valiosas.
Saudando-nos em nome do Senhor, o
nobre Instrutor, de imediato, considerou:
— Conforme estão informados os caros
amigos, o nosso irmão Teofrastus tem sido hóspede querido desta Casa. Desde as
entrevistas que mantivemos, ora no Anfiteatro, ora no Lazareto em que se
encontra Henriette-Marie e aqui mesmo, recolheu-se o antigo mago de Ruão a
meditações muito profundas e a arrependimento perfeitamente compreensível.
Despertar para a verdade é, também, nascer para a responsabilidade. Conhecer o
bem significa renunciar ao erro. O cego que se demora sem o contágio da visão
por longos anos, ao despertar em manhã de formoso dia, sente a ardência da luz
e experimenta o sofrimento que a claridade lhe produz; refaz o caminho pela
noite tormentosa e padece, embora embriagado de luminosidade. Identificar-se
com a vida abundante pode parecer embate fácil; perseverar, no entanto, na comunhão
com a Vida Maior representa esforço sacrificial e continuado contra a aclimatação
em que se vivia. Nesse sentido, o Mestre sempre fora incisivo e conciso: «Não
voltes a pecar para que te não aconteça algo pior» — enunciava Ele aos
recém-curados.
Um intervalo natural na exposição do
Amigo Espiritual se fez espontâneo. E prosseguindo, clarificou:
— Marcado pela revolta que o consumia,
lentamente, nesse largo período de tempo, desde a arbitrária punição pela
fogueira, de que foi vítima, nosso amigo acalentou na mente a chama da
vingança, buscando, implacável, aqueles que foram os responsáveis pelo seu
sofrimento. Como, porém, o ódio enceguece e oblitera as fontes da razão, não
conseguiu identificar exatamente aquele que tramou a infame tragédia, vindo a
encontrá-lo só agora, em situação ainda mais inditosa do que a sua. Conservou,
no entanto, do Cristianismo, a concepção infeliz que lhe deram os seus
atormentadores; dos que se locupletam à sombra da fé para usufruírem benefícios
pessoais; dos que têm nos lábios mel e no coração ácido terrível; dos pastores
que devoram as ovelhas, e das ovelhas que são, em última análise, “lobos
disfarçados de ovelhas”. A doçura do amor de Jesus foi-lhe apresentada entre
labaredas que lhe lamberam as carnes e em fumo que o asfixiou até a morte...
Ante a adulteração dos ensinos do Mestre, conforme lhe chegaram nos dias da
ignorância medieva, conserva até hoje aversão pelo nome do Cristo e pela
Doutrina que Ele nos legou. Invigilante, tornou-se calceta de si mesmo e,
atormentado pela ausência de lume no velador da paz, sem combustível de
esperança, fez-se todo suspeita, arrogância, inquietação, conquanto o cansaço
do mal empreendido por largo espaço e o receio de que já lhe esgotavam as
forças para prosseguir...
«Colhido nas malhas dos atos
reprocháveis, acredita-se novamente vítima das circunstâncias. Ignorando que
os nossos atos nos elegem vítimas ou algozes de nós mesmos, e que, por mais
cruel seja a nossa atuação, não fugimos ao nosso destino de felicidade, mais
hoje ou mais tarde. Soou para ele o momento da redenção necessária e difícil,
que já começa, porém. Imenso trajeto o espera, longo mergulho na carne
sofredora o aguarda a benefício dele mesmo.
Depois de breves instantes de
expressivo silêncio, prosseguiu:
— Enquanto se dispõe em definitivo à
renovação espiritual — já que nos não cabe constrangê-lo sob qualquer pretexto
ou circunstância, a fim de ser recambiado para recinto próprio em nossa Esfera,
onde se deverá preparar para as lutas da sublimação futura, observa as tarefas
que aqui se desdobram, a atuação dos cristãos novos, a conduta real que se
deriva da fé raciocinada, o nível de amor inspirado no amor do Cristo...
Acompanha as operações socorristas dirigidas aos sofredores de ambos os planos
da vida, que aqui vêm trazidos, e, sobretudo, com a nossa assistência
afetuosa, segue os lidadores da fé, servidores da semeação evangélica e os
médiuns trabalhadores para sentir se os ensinamentos nesta Casa ministrados
são aplicados na conduta diária pelos que os administram... Verifica a forma
pela qual se comportam os espíritas sob a constrição do testemunho e da prova,
da perturbação e da dor, confirmando pelos atos a sua identificação com o
Cristo. Temos-lhe ensejado o conhecimento do ministério da fraternidade
desenvolvido pelo nosso Templo, de modo a facultar-lhe o conhecimento do vero
Cristianismo, em face das idéias que cultivou e nutriu em torno da Religião de
que foi vítima no passado. Embora conhecedor dos objetivos do Espiritismo,
habituado como se encontrava às restrições que mantinha quanto à dignidade
humana, conhecedor das fraquezas do caráter das criaturas, deixou-se arrastar
pelos próprios conceitos, enveredando nos meandros das suspeitas e das desconsiderações
às mais nobres florações da fé sob qualquer designação. Apesar disso, a débil
chama da fé natural, da necessidade de uma sua religação com a Verdade,
realizava o seu mister, deixando-o, não poucas vezes, receoso quanto ao
futuro, ansioso sobre o porvir... Vivendo a esfera imortal, de cujas
realidades não podia duvidar nem fugir, acompanhando processos diários de
reencarnação e desencarnação, temia ser colhido pelas teias da Lei Superior,
desarmado para a consciência de si mesmo, emaranhado quanto se encontrava na
trama do desgoverno íntimo pelo ódio.
Novamente o Amigo Espiritual,
desejoso de resumir um destino numa narração breve, deixando traduzir
à comiseração de que se via possuído, ante o inditoso espírito, aduziu:
— Teofrastus, nosso irmão, necessitado
de nosso auxílio , auxílio que nos vem do Alto é, também, lição viva para
todos. Nenhum de nós está isento de ser vítima de circunstâncias que tais,
derrapando nos abismos do desespero e da alucinação, através de cuja queda
poderemos retardar em demasia o nosso progresso, a nossa dita. Muito justo que
vejamos nele o nosso passado ou o que poderia ser o nosso presente, caso não
tivéssemos, aquinhoados como fomos, sabido receber e aceitar o convite de
Jesus, nosso Amigo e Mestre. Desse modo, a nossa, particularmente a vossa responsabilidade
é muito grande, em face da conduta que devemos viver, de forma a que a nossa
mensagem lhe fale ao espírito atormentado com a excelente linguagem do amor do
Cristo aplicado aos nossos atos. Testemunha da nossa vivência evangélica,
incorporará as lições ouvidas e vistas ao patrimônio íntimo, consoante lhas
ofereçamos, adquirindo forças ou não para doar-se Àquele que nos levanta e
ampara, podendo, pelo amor, levantá-lo e ampará-lo, também. Não é inútil que o
Apóstolo dos Gentios nos adverte, através da epístola aos Hebreus, no capítulo
12, versículos 1 e 2: «Portanto, também
nós, visto que temos ao redor de nós
tão grande número de testemunhas,
pondo de lado todo o impedimento, e o pecado que se nos apega, corramos com perseverança a carreira que nos está proposta, fitando os olhos em Jesus, autor e consumador da fé, o qual pelo gozo que lhe foi proposto suportou a cruz, desprezando a ignominia...».
Indubitavelmente «temos testemunhas ao
redor de nós» e são muitas, em número superior ao que se pensa, estas, que são
os homens, e aquelas que, do Mundo Espiritual, acompanham o que pensamos,
dizemos e fazemos...
QUESTÕES PARA ESTUDO
1) Que diferenças
existem entre as lutas travadas pelos cristãos na época em que Jesus esteve
encarnado e os cristãos dos dias atuais?
2) Como podemos
entender esta expressão do texto: “O cego que se demora sem o contágio da visão por longos
anos, ao despertar em manhã de formoso dia, sente a ardência da luz e
experimenta o sofrimento que a claridade lhe produz?”
3) Existem vítimas
de acordo com a doutrina espírita? Justifique.
4) De que forma
Teofastrus pode ser uma “lição viva” para todos nós?
Bom estudo a todos!!
Equipe Manoel Philomeno
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