Livro em
estudo: Nos Bastidores da Obsessão – Editora FEB - 1970
Autor: Espírito
Manoel Philomeno de Miranda, psicografia de Divaldo Pereira Franco
A033 – Cap. 13
– Solução inesperada – Primeira Parte
13 - Solução
inesperada
Após quinze
dias de internamento no Hospital do Pronto Socorro, o Sr. Mateus foi trasladado
para o lar com expressivos sinais de breve recuperação orgânica.
Visitando-o na
primeira oportunidade com Petitinga, ouvimos a narrativa dos antecedentes do
grave delito de que se fizera vítima, impressionando-nos observar a carga de
ódio acumulada na mente que destilava, prestes a explodir com revolta e
desassossego.
O Sr. Mateus
era um homem de quase sessenta anos, sanguíneo, voluntarioso. Perturbado em si
mesmo, atravessava a existência carnal saltando de leviandade em leviandade,
muitas vezes esquecido dos deveres de esposo e pai, fascinado pelo pano verde,
em que se aventurava, atirando fora os parcos recursos que, se aplicados no
lar, seriam de alta valia para o bem da família constituída de seis filhas.
Em compensação,
Dona Rosa se desdobrava nos deveres domésticos e na costura, até altas horas da
noite, para suprir, com o esforço de algumas das filhas, as necessidades
domésticas. Irreligioso por temperamento rebelde, sempre descurara dos deveres
espirituais para consigo mesmo. Em tempos idos fora excelente artista, recebendo
agora uma parca pensão do Montepio a que se vinculara antes, por ter sido
considerado inapto a prosseguir na profissão.
À medida que a
decrepitude das forças se avizinhava e temeroso da desencarnação, fazia-se mais
azedo, quase insuportável...
Por ocasião do
retorno de Mariana ao lar e impressionado com as informações e esclarecimentos
de Petitinga sobre a obsessão e os cuidados que todos nos devemos impor para
evitar-lhe as tramas infelizes, pareceu modificar o comportamento, por alguns
dias... Depois, como se ficasse alucinado, entregou-se a desmandos, e não
poucas vezes, açulado pelos desencarnados afins, ameaçava expulsar do lar,
quando necessitava de dinheiro para as aventuras, a esposa abnegada e as
filhas. O ambiente doméstico, com a sua presença, se fazia pestilencial pelas
emanações fluídicas abundantes, que ali campeavam desordenadas.
Petitinga,
ameno e cortês, após escutar as promessas de desforço do infortunado agredido,
relatou-lhe a experiência de Jesus-Cristo e as Suas lições, sem lograr, de imediato,
qualquer resultado. De mente viciada por longos anos de desequilíbrios
contínuos, o esposo de Dona Rosa sintonizava na faixa do despautério moral e se
permitia o conúbio com os seus antigos comparsas, apresentando- se irredutível
nos pontos de vista, na conduta, nas atitudes.
Dizia aceitar o
concurso do Espiritismo, conquanto fosse apenas para libertá-lo mais facilmente
do leito, de modo a facultar-lhe de pronto o retorno aos sítios da sua
humilhação, retomando a pureza da sua honra...
Solícito, utilizando-se
do ensejo, o zeloso amigo convidou-nos a orar e, em sentida peroração, exorou
os recursos divinos para aquela família, mas principalmente para o genitor
enfermo, rogando a interferência do Médico Divino que nunca falta, de modo a
que o lar dos Soares não fosse arrastado a drama mais grave e a consequências
imprevisíveis. As palavras ungidas de emoção vibravam doces no quarto singelo
qual música delicada, envolvendo-nos em consoladora esperança. A sintonia
natural, espontânea, com as Altas Esferas se fez imediata, e Saturnino, o
abnegado Mentor, tomando o comando mental da Verdade, proferiu expressiva quão
valiosa dissertação sobre os deveres do perdão, como normativa de comportamento
para a própria felicidade.
— “Felizes são
os que perdoam — enunciou, consciente —, porqüanto conferem paz a si mesmos e
por sua vez liberam da dívida os que os ofenderam, entregando-os, desse modo,
às Soberanas Leis encarregadas da evolução dos homens. Os que perdoam e ajudam
conseguem ainda maior galardão, porque amparam os maus e os vencem com a luz da
misericórdia. No entanto, aqueles que conservam as mágoas intoxicam-se,
envenenam-se, dando causa a graves enfermidades que se desatrelam rigorosas,
transformando-se em suplícios demorados, cujos responsáveis, no entanto, são os
que cultivam os pensamentos inditosos e se comprazem na semeação da ira e do
ódio, absorvendo as próprias emanaçoes tóxicas da mente desalinhada. E os que
revidam mal por mal, agressão por agressão, estes já se encontram descambando
na direção do abismo, em posição quase irreversível..
«O amor é pólen
que fecunda a vida, enquanto o ódio é gás que a interrompe...»
A advertência
vazada em termos suaves fazia-se severa, não dando margem a controvérsias ou
mal-entendimentos de natureza alguma. Conclamou-nos, ainda, o Sábio Instrutor
ao cultivo das boas idéias, à vivência da paz íntima, mediante a elaboração de
pensamentos enobrecedores, estimulando-nos à correção mental, de cuja fonte — o
pensamento — procedem os elos da escravidão ou as asas da liberdade que fixamos
às nossas vidas.
Antes de
afastar-se aplicou, generoso, demorado passe longitudinal no paciente,
exortando-o:
— Mude a idéia
do mal em você, meu amigo, antes que a raiva o vença; e esqueça a vingança
antes que a vingança o esqueça em situação dolorosa e lamentável... Jesus nos
ensinou que: «quando estivéssemos orando e mantivéssemos alguma coisa contra
alguém, perdoássemos» (*). Ore e perdoe para ter saúde e paz.
Dona Rosa,
Mariana e Amália, de pé ao nosso lado, orando muito comovidas, deixavam-se
arrastar pelas ondas da Espiritualidade momentânea no ambiente, banhadas por
discreto pranto, qual ocorria com nós mesmos.
Terminado o
intercâmbio inesperado e benéfico, Petitinga sem delongas encerrou o trabalho
de socorro e, após as despedidas, saímos na direção dos nossos lares.
— Pressinto que
— informou-me o amigo — o nosso Mateus experimentará, em benefício dele mesmo,
inestimável lição que o convidará a demorada reflexão sobre o destino e a vida
que lhe tem transcorrido sem maiores consequências. Todos esses que se dizem
«indiferentes» com referência ao problema da fé, acobardam-se dolorosamente
ante as realidades da desencarnação. Acomodados à irresponsabilidade como
vivem, quando neles irrompem os clarões prenunciadores do novo dia, ou chegam
as primeiras sombras da travessia pelo vale da morte, debatem-se aflitos,
esbravejam, fazem promessas, negociam...
— Como suporta
Dona Rosa — indaguei — tão pesada carga em ombros frágeis quais os seus?
— Pelo que
estou informado — explicou prestimoso — pelos nossos Benfeitores Espirituais,
ela foi-lhe mãe descuidada em vida próxima, no pretérito. Acompanhando-o da
Espiritualidade, de queda em queda, acumpliciado com os pesados débitos da
última existência, após a fuga para a Bélgica, que redundou em homicídio
nefando, do qual deve ter sido vítima aquele que ora lhe ergueu a mão
fratricida e em cuja reencarnação escapou à justiça por se ter evadido do país,
ela, apiedada, rogou a oportunidade de ser-lhe esposa, recebendo nos braços
como filhos os inimigos de ambos, para, então, pelo exemplo da paciência, da
humildade e da submissão, ressarcir o crime da irresponsabilidade junto a ele,
e chamá-lo à observância dos deveres de que se descura acintosamente. Como
podemos observar, o caráter exaltado de que dá mostras, o mau-humor contínuo de
que se reveste, atestam o fogoso espírito encarcerado, sem possibilidades de
revelar-se em toda a pujança do seu primitivismo. Ela, no entanto, avança
vitoriosa, e creio mesmo que o seu sacrifício e a sua fidelidade aos postulados
que abraça no Espiritismo terminarão por vencer galhardamente o opositor,
conduzindo-o à retidão de princípios. Vale considerar que a sua folha de
méritos é igualmente apreciável. O martírio maternal que tem experimentado na
atual conjuntura consagra-a nesta vida, reabilitando-a da negligência de
equivalente compromisso no pretérito.
«Carinhosamente
amparada pelos seus afeiçoados no Plano Espiritual, ela adquire forças para
compensar os desgastes na luta ferrenha do lar atormentado, invadido por infelizes
visitadores espirituais, que ali teimam por fazer morada, graças aos demais
familiares residentes. De certo modo isolada, tanto quanto as meninas Mariana e
Amália, dos miasmas fluídicos do ninho doméstico, criaram já sua própria
«psicosfera pessoal», que as isenta das agressões dos desencarnados menos
afortunados. Como você observa, Mariana tem-se revelado dedicada cooperadora da
nossa Casa e, logo mais, estará devotada ao exercício da mediunidade
socorrista, conforme esperamos, adquirindo valiosos recursos para a manutenção
da saúde e da paz. Amália, cumpridora dos seus deveres de filha e irmã, é
excelente servidora, ganhando fora do lar em trabalho modesto e honrado o pão,
mediante cuja cooperação ajuda a manutenção das demais irmãs. A Contabilidade
Divina dispõe, também, dos métodos de correção benéfica dos depósitos a favor
dos titulados nos seus Livros. »
Reflexionando,
verifiquei a legitimidade e o acerto dos conceitos emitidos, ao nos
despedirmos.
Os dias
transcorriam absorvendo-nos nas atividades múltiplas a que nos filiáramos,
quando Petitinga voltou a convidar-nos a retomar ao lar da família Soares,
atendendo à aflita apelação de Dona Rosa.
Quando lá
chegamos, a veneranda Senhora recebeu-nos macerada de sofrimento. O esposo
encontrava-se quase agonizante. O médico saíra havia pouco do lar, informando
que o prognóstico era desalentador. Ficara hemiplégico, apresentando o doloroso
aspecto do desastre orgânico. Todo um lado estava paralisado e os estertores
agônicos de que dava mostras, semidesfalecido, confrangiam a alma. O próprio
médico se dizia sem esperanças. Muito mais entristecedor era o quadro aflitivo
do lar... A sofrida matrona, com a imensa carga das noites indormidas e os
esforços sobre-humanos para manter a família, definhava sob a aspereza das
rudes provações...
Petitinga
ouviu-a demoradamente, com paciência, enquanto, na sala de refeição, a esposa e
mãe narrava a quase tragédia que resultara no não menos danoso problema que
agora defrontávamos.
Conquanto a sua
humildade e carinho, fora constrangida a admoestar a filha Marta, que
continuava nas arriscadas aventuras de feticismo.
Às vésperas,
quando chegara, noite avançada, a genitora lhe reprochara o comportamento,
advertindo-a quanto à cooperação que deveria oferecer para a paz do lar e a
recuperação do pai enfermo, que vencia o primeiro mês da agressão com ótimos
resultados, quase recuperado. Rogou-lhe a ajuda espiritual, através da prece e
da mudança de atitude em relação à fé, a fim de que os Mensageiros Invisíveis
pudessem renovar a atmosfera da vida familiar, modificando o carreiro das
provações que todos experimentavam como consequência funesta dos erros
passados. Suplicava-lhe não se adentrasse mais no emaranhado labirinto de
trevas por onde seguia...
Fora o
bastante. A filha, possessa, desrespeitosa, agrediu-a moralmente com palavras
fortes e azedas, transformando em altercação violenta o que não passava de
sereno convite materno à reflexão, à dignidade, ao equilíbrio. Furiosa, tentou
agredir físicamente a mãe que lhe estava em frente, não conseguindo o intento,
graças à interferência providencial de Amália e Mariana, que lhe correram em
auxílio .
As forças
negativas de que se fazia habitualmente instrumento irromperam intempestivas e
o Sr. Mateus, acordado sübitamente, ouvindo o clamor e a balbúrdia, levantou-se
do leito precipitadamente, marchando revoltado, colérico, armado com uma acha
ameaçadora. A poucos passos, cambaleou e tombou ao solo...
Fora
indescritível a cena. A ferida cirúrgica, ainda não cicatrizada de todo, voltou
a sangrar e, tomadas providências de imediato, retornou ao Pronto Socorro. Lá,
foram aplicados os recursos compatíveis ao caso e, no momento, se encontrava na
«tenda de oxigênio», lutando pela sobrevivência do corpo, com diagnóstico de
embolia cerebral.
QUESTÕES
PARA ESTUDO
1
– Observamos que o Sr. Mateus, incentivado por perseguidores espirituais, ainda
desejava vingar-se da agressão sofrida. Porém, Petitinga, aplicando-lhe o passe
sob sentida prece, afirma “Felizes são os que perdoam...” Por quê?
2
– De que modo D. Rosa se ligava ao Sr. Mateus? E qual era sua missão perante
ele nesta reencarnação?
3
– Na casa de D. Rosa havia um clima de intensa perturbação, devido aos
espíritos que para ali eram atraídos por alguns dos familiares. Não obstante, a
mãe e suas filhas Amália e Mariana não recebiam diretamente as irradiações
dolorosas. Por quê? Que seria a “psicosfera pessoal” que Petitinga cita?
Bom
estudo a todos!!
Equipe
Manoel Philomeno
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