segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Livro em estudo: Nos Bastidores da Obsessão - A014 – Cap. 3 – Técnica de Obsessão – Primeira Parte


Livro em estudo: Nos Bastidores da Obsessão – Editora FEB - 1970

Autor: Espírito Manoel Philomeno de Miranda, psicografia de Divaldo Pereira Franco

A014 – Cap. 3 – Técnica de Obsessão – Primeira Parte


3 - Técnica de obsessão

 
Saturnino solicitou a Ambrósio que aplicasse recursos magnéticos nos centros coronário e cerebral de Mariana, de modo a despertar-lhe o passado adormecido nas telas da memória.
Ativados os chakras (*), através dos passes hàbilmente aplicados, a paciente desdobrada parcialmente pelo sono físico pareceu sofrer um delíquio para logo modificar a expressão semelhante a alguém que acorda após demorado sono, no qual pesadelos cruéis houvessem tomado corpo destruidor... Do mal-estar momentâneo passou a um aspecto de desvario, através do qual as palavras fluíam ora no idioma de Mariana ora na língua de Aldegundes para firmar-se nos vocábulos em que se exprimia esta última. Parecendo reconhecer Guilherme, o vigoroso perseguidor, estremeceu, olhando-o, esgazeada, como se desejasse fugir. Lentamente se lhe transfigurou o semblante que adquiria as características fisionômicas de harleniense do passado. Eram visíveis os sinais da loucura que dela se apossara nos últimos dias da existência física. Do descontrole inicial passou à mortificação, libertando-se dos braços acolhedores de dona Rosa e arrojando-se aos pés do antigo esposo, a rogar-lhe perdão, em lancinantes, agoniados apelos.
Ouvindo-a, lúcida, na forma antiga, Guilherme adquiriu expressão patibular e rechaçou-a, com mordacidade.
— Eu estava desesperada — justificou-se em pranto — quando fugi do nosso lar. Perdoa-me! Ignoras o que padeci e ainda padeço na masmorra em que agora me movimento (referindo-se ao corpo de Mariana)... Há uma dor inidentificável em minhalma e uma noite sombria de horror me segue, sem trégua. Não consigo chorar, por ignorar a razão dos sofrimentos quando os punhais invisíveis da justiça me alcançam. Só uma revolta pesada me agrilhoa a um desejo incoercível de morrer, de sumir, de perder a consciência para sempre...
— Isto — retrucou o antigo companheiro — é apenas o início das penas que te aguardam. Agora, sim, verterás o pranto da reparação que quando, saciado, eu me possa considerar capaz de absolver-te a indignidade Sem limite. Saturnino, Ambrósio e os demais Assessores Espirituais, embora em atitude de alerta, mergulhados em pensamentos salutares, deixavam que as duas Entidades por momentos se reencontrassem mediante o diálogo doloroso e azedo, que, no entanto, abriria as portas a melhor atendimento...
— Fugi do lar e reconheço o meu crime. Mas ignoras o castigo que experimentei, logo depois. Nunca fui amada: nem por ti, nem por ele. Em tuas mãos, não passei de animal de carga e objeto de vãs emoções... Nas mãos dele não fui além de um vaso de desejos violentos. É claro que a nuvem da ilusão só mais tarde me deixou ver o abismo... E era tarde demais. Voltei, então...
— Tiveste a desgraça de voltar ao Haarlen? — vociferou o esposo desdenhado.
— Achaste, por acaso, insuficiente a punição indébita que me impuseste, a ponto de retornar aos sítios em que éramos conhecidos? Que pretendias desvairada?
— Rogar-te perdão, eu que ainda supunha que me amavas.
— Amar-te, quando arruinaste minha vida? Supunhas que a desonra pudesse ser lavada com lágrimas?
— Nada eu supunha. Esperava piedade e comiseração, um pedaço das nossas terras para sucumbir entre as tulipas que eu mesma plantara e em cujos campos conseguíramos os inigualáveis exemplares das Gesnerianas, Clucianas, Turcisas... Dilacerada pela saudade e pelos remorsos, acalentava como um náufrago uma tênue possibilidade de salvação.
— Ignoravas, certamente, que envergonhado e ferido fugi... não conseguindo morrer. Aumentando a minha desgraça, não poucas vezes forças demoníacas me punham ao teu e ao lado do desalmado ladrão, para me supliciarem com a visão alucinante sem limite. Como os odeio! Como os detesto!... É impossível, infame, qualquer tentativa de...
— Negas-me, então, ainda hoje, a gota de misericórdia? E quem és tu, senão o responsável maior pela minha infelicidade? Como te atreves a ferir-me com o teu escárnio, o teu ódio? Sim, também te odeio, deixa-me dizê-lo, como te odiava antes e não o sabia. Nunca me deste oportunidade de amar. Negociaste minha vida com os meus pais, considerando a minha juventude e minha saúde, e ninguém, nem tu nem eles, jamais procurou saber se eu possuía um coração ou acalentava um sonho de menina...
E soluçando, comovedoramente, prosseguiu:
— Amante do dinheiro, a nada mais querias, senão qualquer coisa que se constituísse meio de possuir mais. Fizeste de mim uma igual aos teus empregados, nas leiras sem-fim dos bulbos, entre os canteiros de tulipas. Nelas, porém, encontrei ligeira felicidade; nas suas pétalas descobria o milagre da vida, a beleza e a cor que me roubavas... E depois? Mais velho do que eu quase 30 anos, eras verdugo cruel.
— Não te justifiques, infeliz — bradou, apoplético.
— Trar-te-ei a verdade, agora, dizendo-te o que nunca me atrevera mostrar-te antes. Sim, dir-te-ei. Eras e continuas ambicioso e frio. Quando demandaste Leider e depois Amsterdão para negociar com o governo terras e terras que viriam da dessecagem do lago, deixando-me só, entre teus empregados e teus amigos, não zelavas por mim. Tornavas-me o fiscal dos teus bens, a serva que inspecionava os servos. Contrataste Jacob, que chegara fazia pouco dos primeiros Geest do golfo, acostumado aos labores no Waal (1), e que, jovem como eu, me sensibilizara o coração em constante soledade. Relutei muito, entre a fidelidade ao teu abandono e a solidão da felicidade.
A Entidade sofrida não pôde continuar. As tormentosas evocações alanceavam-na.
Depois de uma pausa, prosseguiu, ante a expectação de Guilherme, que parecia atoleimado com as informações que lhe chegavam então.
— Fugimos para Amsterdão; nunca, porém, fugi de mim mesma. Nos primeiros tempos, ainda dominada pela paixão que me enceguecera, consegui sobrepujar o remorso. Depois... Despertei abandonada seis meses após na Cidade, em miserável condição de desprezo entre mulheres infelizes do porto. Deixara-me Jacob, que jamais me tivera qualquer afeição, fugindo para a Bélgica, após ter-me iludido, sem retornar jamais. Compreendes o que me aconteceu? E isto não é tudo!
Depois de deambular na mais estúpida miséria, não suportando as humilhações que eram superiores às minhas forças, lembrei-me dos campos floridos e da terra generosa...
Voltei e busquei-te. Só então eu soube... Haviam-se passado apenas 5 anos! Eu nem sequer fora reconhecida pelos antigos vizinhos, tal o meu estado.
Informada da tragédia que eu causara, enlouqueci, e desvairada pelas ruas do Haarlen fui lançada ao hospício, como um animal numa jaula, onde sorvi por longos anos a própria desdita até que a morte me libertou... para dores muito maiores. Na minha loucura eu te via agoniado, a maldizer-me, a perseguir-me. Vês, agora!?
Tudo por culpa tua, do teu egoísmo.
— Sim, eu estava ligado a ti sem o saber... E nunca mais encontraste Jacob? — indagou Guilherme.
— Nunca! Se eu o encontrasse, que não faria com esse meu outro algoz!...
— Pois eu te direi: vives novamente com ele. sua filha!
— Filha?! Deliras... Através de qual sortilégio o inimigo poderia tomar o corpo de meu pai? Não zombes de mim.
— Ouve, Aldegundes: morreste e voltaste a viver, esta é a verdade.
Guilherme demonstrava na voz todo o seu desprezo. Logo depois, prosseguiu:
— Deus, que é justiceiro, dele fez o teu pai, unindo os dois para que eu agora me possa vingar. Vês porque não me fugireis do guante da reparação? Mateus que é o teu pai, pai de Mariana, em cujo corpo vives prisioneira, é o teu ex-amante e o meu infelicitador, novamente reunidos. Agora poderei...
Nesse momento, Saturnino pousou a destra na fronte de Mariana, dominada pelas recordações do passado, e utilizando recursos magnéticos fê-la adormecer, pausadamente.
Guilherme, aturdido, pôs-se a deblaterar, enquanto Ambrósio o socorria, diminuindo-lhe o campo de ação.
 
(*) Chakra é uma palavra sânscrita que significa roda... — Nota do Autor espiritual.
(1) O golfo referido é o de Zuiderzê, que neste século foi em grande parte escoado e dessecado, transformando-se em terras cultiváveis (Geest). Sendo quase substituido nos últimos quarenta anos em quatro pôldres. O Waal é um dos cursos dágua do Reno, onde há uma aldeia do mesmo nome. — Nota do Autor espiritual.
 
QUESTÕES PARA ESTUDO
1 – Quem era Mariana na experiência material anterior? Quais atitudes suas causaram a atual perseguição espiritual?
2 – Qual a parcela de responsabilidade de Guilherme na tragédia vivida?
3 – E quanto a Jacob, hoje Marcelo? Por que este continua próximo a Mariana, agora na condição de pai?
 
4 - Comente seu entendimento sobre o capítulo.

 

Bom estudo a todos!!
Equipe Manoel Philomeno

Nenhum comentário:

Postar um comentário