quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

No Japão, alunos limpam até banheiro da escola para aprender a valorizar patrimônio

No Japão, alunos limpam até banheiro da escola para aprender a valorizar patrimônio


Ewerthon Tobace
De Tóquio para a BBC Brasil

Enquanto no Brasil escolas que "obrigam" alunos a ajudar na limpeza das salas são denunciadas por pais e levantam debate sobre abuso, no Japão, atividades como varrer e passar pano no chão, lavar o banheiro e servir a merenda fazem parte da rotina escolar dos estudantes do ensino fundamental ao médio.

"Na escola, o aluno não estuda apenas as matérias, mas aprende também a cuidar do que é público e a ser um cidadão mais consciente", explica o professor Toshinori Saito. "Ninguém reclama porque sempre foi assim."

Nas escolas japonesas também não existem refeitórios. Os estudantes comem na própria sala de aula e são eles mesmos que organizam tudo e servem os colegas.

Depois da merenda, é hora de limpar a escola. Os alunos são divididos em grupos, e cada um é responsável por lavar o que foi usado na refeição e pela limpeza da sala de aula, dos corredores, das escadas e dos banheiros num sistema de rodízio coordenado pelos professores.

"Também ajudei a cuidar da escola, assim como meus pais e avós, e nos sentimos felizes ao receber a tarefa, porque estamos ganhando uma responsabilidade", diz Saito.

Michie Afuso, presidente da ABC Japan, organização sem fins lucrativos que ajuda na integração de estrangeiros e japoneses, diz ainda que a obrigação faz com que as crianças entendam a importância de se limpar o que sujou.

Um reflexo disso pôde ser visto durante a Copa do Mundo no Brasil, quando a torcida japonesa chamou atenção por limpar as arquibancadas durante os jogos e também nas ruas das cidades japonesas, que são conhecidas mundialmente por sua limpeza quase sempre impecável.

"Isso mostra o nível de organização do povo japonês, que aprende desde pequeno a cuidar de um patrimônio público que será útil para as próximas gerações", opina.


Estrangeiros

Para que os estrangeiros e seus filhos entendam como funcionam as tradições na escola japonesa, muitas prefeituras contratam auxiliares bilíngues. A brasileira Emilia Mie Tamada, de 57 anos, trabalha na província de Nara há 15 e atua como voluntária há mais de 20.

"Neste período, não me lembro de nenhum pai que tenha questionado a participação do filho na limpeza da escola", conta ela.

Michie Afuso diz que, aos olhos de quem não é do país, o sistema educacional japonês pode parecer rígido, "mas educação é um assunto levado muito à sério pelos japoneses", defende.

Recentemente no Brasil, um vídeo no qual uma estudante agride a diretora da escola por ela ter lhe confiscado o telefone celular se tornou viral na internet e abriu uma série de discussões sobre violência na escola.

Outros casos de agressão contra professores foram destaques de jornais pelo Brasil nos últimos meses, como da diretora que foi alvo de socos e golpes de caneta em Sergipe e da professora do Rio Grande do Sul que foi espancada por uma aluna e seus familiares durante uma festa junina.

No Japão, este tipo de abuso dentro da escola é raro. "Desde os tempos antigos, escola e professores são respeitados. Os alunos aprendem a cultivar o sentimento de amor e agradecimento à escola", diz Emilia.


Violência

No ano passado, durante as eleições, a BBC Brasil publicou uma série de reportagens sobre a violência de alunos contra professores no Brasil. As matérias revelaram casos de professores que chegaram a tentar suicídio após agressões consecutivas e apontaram algumas das soluções encontradas por colégios públicos para conter a violência – da militarização à disseminação de uma cultura de paz entre escolas e comunidade.

Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que ouviu mais de 100 mil professores e diretores de escola em 34 países, o Brasil ocupa o topo de um ranking de violência em escolas – 12,5% dos professores ouvidos disseram ser vítimas de agressões verbais ou intimidação pelo menos uma vez por semana.

"Assim como o Brasil tem um programa de intercâmbio com a polícia japonesa, poderíamos ter um na área educacional", propõe Michie, da ABC Japan, ao se referir ao sistema de policiamento comunitário do Japão que foi implantado em algumas cidades do Brasil.

A brasileira lembra que a celebração dos 120 anos de relações diplomáticas entre Brasil e Japão seria uma ótima oportunidade para incrementar o intercâmbio na área social e não apenas na comercial.

"Dessa forma, os professores poderiam levar algumas ideias do sistema de ensino japonês para melhorar as escolas no Brasil", sugere Michie.

Notícia publicada na BBC Brasil, em 11 de novembro de 2015.


Claudia Abreu* comenta

Gostei muito da matéria e da atitude dos Japoneses. Dá para perceber que nas questões que se referem a educação e ao sentimento de responsabilidade de cada um como cidadão, eles estão bem a frente. O Brasil, infelizmente, não tem essa cultura, muitos acham que se o seu filho limpar o chão da escola, do banheiro etc, será uma humilhação. Não conseguimos, muitas vezes, visualizar a grandeza que tem essa atitude dos japoneses e nem a preocupação que eles têm com o coletivo. Para nossa reflexão, devemos nos perguntar: Será que eles ensinam seus filhos erroneamente e são rigorosos demais? Ou nós que estamos equivocados em achar que não temos responsabilidades em cuidar e proteger do que é de todos?

O Brasil não tem essa cultura de cuidar do que é público e de limpar o que sujou, achamos que sempre tem um responsável para esses serviços e que não precisamos nos preocupar. E acreditamos que a criança deva ir para a escola apenas para ganhar conhecimento intelectual e amanhã ser um profissional bem sucedido materialmente.  Mas esquecemos o quanto é importante passar para elas a responsabilidade que devemos ter com as coisas e o cuidado que devemos ter com as pessoas.

É preciso que haja uma boa parceria entre a família e a escola, para que não falte o respeito e os ensinos para um cidadão mais consciente e responsável. Ainda temos muitas dificuldades para entender que precisamos trabalhar sempre em prol da coletividade e do bem ao próximo.

* Claudia Abreu é espírita e colaboradora do Espiritismo.net.

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