A incrível história do homem sem
documentos encontrado no Brasil 5 anos após desaparecer no Canadá
Liège
Albuquerque
De Manaus para a BBC Brasil
De Manaus para a BBC Brasil
Um canadense que passou cinco
anos desaparecido e foi encontrado andando por estradas de Rondônia e Amazonas
sem documentos e dinheiro - e sem saber ao certo sua identidade - conseguiu se
reunir com sua família em Toronto.
Anton Pilipa, de 39 anos, foi
abordado por uma policial rodoviária no final de novembro quando perambulava na
BR 364 em Rondônia, colocando sua vida em perigo no meio dos veículos.
Ele foi levado a um hospital em
Porto Velho. Enquanto as autoridades tentavam identificá-lo, com ajuda de
embaixadas e de listas de desaparecidos, o homem fugiu do hospital.
Quando foi encontrado novamente,
no início do ano, andando por uma estrada na entrada de Manaus, já se sabia
quem ele era: tratava-se de um cidadão canadense, que tinha desaparecido em
2012 pouco depois de iniciar um tratamento para esquizofrenia.
Poucas
palavras
Anton é de poucas palavras. Em
conversa com a BBC Brasil em Manaus, de onde partiria o voo que levariam ele e
seu irmão, Stefan Pilipa, de volta para casa, Anton não deu detalhes de sua
peregrinação, talvez pelo efeito dos medicamentos para controlar a esquizofrenia.
"Nunca me senti
sozinho", diz ele, de voz mansa. "Foram anos pensando muito, dormindo
ao relento. É muito simples viver, não precisamos de muitas coisas."
Anton perambulou por cidades e
vilarejos de pelo menos nove países desde o Canadá, como Estados Unidos,
México, Guatemala, Costa Rica, Panamá, Colômbia, Venezuela e Brasil.
Ele conta que, na maior parte do
tempo de suas andanças, buscava alimentos e roupas em lixeiras, e que, às
vezes, recebia comida de algumas pessoas. Mas diz também ter topado com
"pessoas más" pelo caminho. "Mas (recebi) mais generosidade,
especialmente nos últimos tempos".
'Emoção
indescritível'
O irmão, Stefan, relata que a
família recebeu pouco antes do Natal a notícia de que Anton tinha sido
encontrado a mais de 10 mil quilômetros do Canadá.
"Foi uma emoção
indescritível, porque uma pessoa perdida na família deixa todos em uma espera
interminável, algo difícil de explicar", diz Stefan.
"Uma morte em vida, porque
não se sabe se a pessoa morreu, se está doente, se está comendo. Isto abala a
todos para sempre", acrescenta.
Segundo ele, o contato foi feito
graças à iniciativa da policial rodoviária Helenice Campos, que abordou Anton
na estrada de Rondônia, quando este parecia um mendigo, que há meses usava a
mesma bermuda azul e camiseta, proferindo xingamentos e palavras desconexas.
Helenice o conduziu a um hospital
em Porto Velho e encontrou o irmão de Anton no Twitter.
Stefan relatou a emoção ao
constatar que a Polícia Rodoviária Federal tinha divulgado fotos de seu irmão,
e que a busca por sua identidade teve grande repercussão na internet. Ele
chegou a receber ligações de mães de associações de desaparecidos de todo o
mundo, algumas dizendo ter a esperança de Anton ser seu filho sumido, mas todas
felizes por ele ter encontrado sua família.
"Nossa história trouxe a
elas esperança, porque é algo muito difícil de ter constantemente numa situação
dessas, sem traços dos passos da pessoa, sem pistas, só dor e ansiedade",
conta Stefan.
A família começou a se mobilizar
para conseguir dinheiro para buscá-lo, chegando a criar uma conta de
financiamento coletivo na internet para ajudar a bancar custos, como as
passagens de avião.
Entre os que o aguardavam em
Toronto, estava a mãe, de 65 anos, e a filha mais velha de Stefan, de 15 anos,
que sempre foi muito ligada ao tio.
No mesmo dia em que desembarcou
no Canadá vindo do Brasil, Anton compareceu à Justiça e foi detido sob acusação
de tentativa de agressão.
A agressão teria sido cometida em
29 de janeiro de 2011. Ele foi intimado na época, mas desapareceu antes da data
marcada para comparecer perante a Justiça. Ao se apresentar agora, foi solto
sob fiança e com audiência marcada.
Desaparecimento
em Toronto
Quando Anton desapareceu, em
março de 2012, ele iniciava um tratamento contra sua doença mental. Por décadas
havia trabalhado em Vancouver, Montreal e Toronto como funcionário de
organizações humanitárias de auxílio a pessoas carentes.
"Fazia pouco tempo que Anton
havia se mudado para um bairro distante de mim e não nos víamos com muita
frequência", conta Stefan.
"Quando percebemos que ele
havia sumido, deixando para trás documentos, roupas e sua casa, informamos seu
desaparecimento de imediato à polícia e publicamos um cartaz na internet".
"O procuramos muito pelo
país, mas nunca tivemos nenhuma notícia sequer, nenhuma pista. Era difícil
manter a esperança de encontrá-lo com vida".
Manaus
Quando foi encontrado perto de
Manaus, todos os postos da Polícia Rodoviária Federal já estavam alertados
sobre o andarilho de cabelos e barba longos e loiros, que ainda mantém. Anton
xingava muito, mas não demonstrava nenhum sinal de ser uma pessoa violenta.
"Muito pelo contrário, ele
xingava com a boca, mas não com o olhar", contou a policial rodoviária
Maria Furtado, que o abordou na BR 319. "Para nós, ele não era mais
invisível e já tinha nome e endereço, felizmente."
"Fiquei emocionada de poder
ajudar nessa história porque são raríssimos os andarilhos que fazem o caminho
de volta para casa", disse ainda.
Durante todo o mês de janeiro,
enquanto Stefan procurava o dinheiro e a documentação de Anton para buscá-lo em
Manaus, ele ficou internado no Hospital Eduardo Ribeiro, na capital amazonense.
Por sorte, a esposa do cônsul do
Canadá em Manaus, Mark Peters, é psiquiatra, e o casal pôde dar assistência ao
conterrâneo.
Anton frisa que estar vivo e
voltar para casa demonstra que ele teve sorte. "Sei que tenho muita sorte
em estar vivo, de alguém ter me ouvido para ser encontrado, e estou muito feliz
por poder voltar para minha família."
Notícia publicada na BBC
Brasil, em 1º de março de 2017.
Claudia Abreu* comenta
Frequentemente vemos em
reportagens de jornais, revistas ou na televisão casos de crianças e adultos
que são dados como desaparecidos. Mas nem sempre os casos são solucionados, ou
com o aparecimento da pessoa ou com uma conclusão do que aconteceu. Mas o caso
do Canadense Anton Pilipa teve um fechamento diferente, pois surpreendentemente
conseguiu ser identificado e encaminhado de volta para a sua família, mesmo
depois de 5 anos fora da sua cidade natal e vagando por cidades de outros
países.
Sabemos o quanto é difícil para
os familiares de pessoas desaparecidas viverem com a falta da pessoa e de
notícias do seu paradeiro, sem saber se um dia irá encontrá-la. A espera é
grande e muito dolorosa, mas a fé e a esperança mantêm acessa a chama do
reencontro um dia. Que no caso da família do Anton Pilipa, como o irmão Stefan
diz na matéria, não estavam mais conseguindo acreditar que ele ainda estivesse
vivo.
Mas felizmente para a família
canadense a longa espera chegou ao fim, pois Anton voltou para casa e pôde rever
a todos e matar as saudades. Pois, de acordo com a fala do irmão, “quando tem
uma pessoa perdida na família deixa todos em uma espera interminável”, mas no
caso deles essa espera enfim terminou.
E Anton nos deixou uma lição
quando disse: “É muito simples viver, não precisamos de muita coisa”, se
referindo às andanças dele durante esses anos fora de casa. Mas nós aqui
encarnados achamos que precisamos de tantas coisas, estamos sempre adquirindo
mais e mais em um consumismo desenfreado, insatisfeitos com o que temos e
desejando adquirir ou trocar por novos os nossos aparelhos, móveis e tantas
outras coisas que utilizamos, mesmo eles estando em perfeito estado e
funcionando. Enquanto que na questão 922 de “O Livro dos Espíritos”, quando se
faz a pergunta: “Haverá, contudo, algum critério de felicidade para todos os
homens? E o Espíritos respondem: Para a vida material, é a posse do necessário;
para a vida moral, a consciência tranquila e a fé no futuro”. Podemos ver que
precisamos realmente de muito pouco para viver.
Mas ele sobreviveu durante esses
cinco anos com a escassez e os percalços que encontrou pelo caminho e agora
está feliz por ter voltado para a sua família. E é muito bom quando vemos uma
história como essa terminar com um final feliz.
* Claudia Abreu é espírita e
colaboradora do Espiritismo.net
Nenhum comentário:
Postar um comentário