Livro em
estudo: Nos Bastidores da Obsessão – Editora FEB - 1970
Autor: Espírito
Manoel Philomeno de Miranda, psicografia de Divaldo Pereira Franco
A040 – Cap. 16
– Compromissos redentores – Segunda Parte
16
Compromissos
redentores
Todos nos despedimos jubilosos, e
meditativos, quanto às nossas responsabilidades espiríticas em relação a nós
mesmos, ao próximo e ao porvir. Os nossos atos fazem escola e a nossa escola
pode transformar-se, por incúria nossa, num mau Educandário.
Naquela noite, viemos a saber pelo
Mentor Saturnino, durante o repouso físico, em desdobramento, que fomos
reunidos na sede da União Espírita Baiana para um encontro provocado pelos
Instrutores.
Ali nos encontramos Petitinga, nós,
o médium Morais, os Soares: Dona Rosa, Sr. Mateus, Marta, e Mariana, Adalberto,
Ana Maria, e os Benfeitores Espirituais.
Alguns dos encarnados se
apresentavam mais lúcidos; outros, menos acostumados às incursões no Mundo
Espiritual para tal finalidade, pareciam sonâmbulos em inquietação. Após a
recepção de passes, todos se mostravam tranquilos.
A reunião foi presidida pelo Irmão
Glaucus, o nobre Mentor que comandara os socorros e estudos desde o Anfiteatro,
incorporado aos labores de desobsessão da família Soares por determinação
superior. Depois de formosa oração e de alocução muito elevada, explicou as
finalidades e objetivos do encontro.
Terminava o seu prazo de estada
entre nós, para aquele mister. Os serviços transcorriam com o êxito esperado.
Fazia-se necessário, porém, definir roteiros para o futuro. Ultimavam-se os
preparativos socorristas para os diversos desencarnados envolvidos nos dramas
das personagens ali presentes. Alguns já haviam recebido o conveniente
tratamento e encontravam-se amparados em círculos fraternos do Mundo
Espiritual, onde conseguiam o auxílio e o esclarecimento de que se ressentiam.
Havia, no entanto, algo mais a fazer.
Terminada a explicação, foram
trazidos de outro recinto da Casa o irmão Teofrastus e Guilherme, por
enfermeiros gentis, que os acomodaram em assentos reservados para ambos.
Adalberto, ao lado de Mariana,
automàticamente lhe deu a mão, como a evitar qualquer sofrimento desnecessário
à noiva. Ana Maria, reconhecendo o antigo amor, fez-se lívida. O Sr. Mateus,
ante a inesperada presença de Guilherme, contanto não estivesse no uso da plena
lucidez, pareceu inquieto...
O Irmão Glaucus retomou a palavra, esclarecendo:
— Aqui estamos vários desafetos de
há pouco, amores do passado, irmãos do futuro e de sempre, no caminho da
evolução. Ódios e paixões, anseios e ternuras são etapas a vencer na rota do
grande amor que um dia nos unirá a todos como irmãos verdadeiros. Não nos
importem as sombras, considerando a luz soberana que brilha sobre nós,
concitando-nos ao avanço. Esqueçamos as mágoas que são nuvens perturbadoras,
abramos o coração e a mente à esperança que é semente de vida germinando no
solo dos nossos espíritos a benefício nosso, O verdadeiro amor não se
enclausura em determinadas expressões do sentimento, que desenvolvem o egoísmo
e a posse anestesiante; antes se dilata em múltiplas manifestações encarregadas
de ampliar os recursos entesourados da afeição, jornadeando nas manifestações
do sangue, através da família, em posições diversas: filhos, pais, irmãos,
parentes, ou, fora dela, na condição de amores que se abraçam em novas
comunhões e efusões, experimentando, aprendendo, valorizando oportunidades. As
circunstâncias e os locais são bancos e lições da Grande Escola da Evolução.
Todos nascemos e renascemos para sublimar até à libertação. Não nos aflijamos,
pois. Valorizemos o ensejo e aceitemos o impositivo evolutivo como diretriz
abençoada para nós mesmos. Jesus é a nossa porta: atravessemo-la, seguindo-Lhe
as pegadas...
Todos nos mantínhamos expectantes,
comovidos. A vida ata e desata, escrevendo nas páginas do livro de cada um de
nós os próprios atos que nos esperam depois, inapelavelmente.
Convidando Mariana e Adalberto, que
se levantaram seguidos por Ambrósio, o Assistente amoroso, o Irmão Glaucus
apresentou Guilherme ao moço, solicitando lhe a receptividade fraterna, pois
que aquele deveria renascer no seu lar, por necessidade imperiosa da sua evolução.
Vítima que fora da leviandade de si mesmo e de Mariana, algoz que se fizera da
moça e de si próprio, renasceria nos seus braços na condição de filho sofredor,
necessitado de imenso carinho e proteção afetuosa...
Visivelmente atormentado, Guilherme
baixou os olhos e, trémulo, não conseguiu dominar as lágrimas abundantes.
Mariana avançou e o envolveu em
abraço de pura ternura.
Sübitamente adornada de tênue luz
que se lhe originava do plexo solar, com coloração opalina, emoldurou o antigo
esposo suicida e falou, igualmente comovida:
— Aproveitemos a lição, meu amigo.
Unamos nossas dores numa só dor e reorganizemos nosso passado num futuro
promissor. Brilha-me hoje diferente luz no espírito; conduz-me nova ética de
vida; animam-me outros propósitos no coração; aquece-me a esperança um sol
diverso... Se o nosso hoje foi marcado por abundantes lágrimas, o nosso futuro
nos espera com sorrisos... Incapaz de ser-te esposa vigilante, tentarei ser-te
mãe cuidadosa. Ajuda-me com o teu perdão e favorece-me com esta oportunidade. O
nosso Adalberto, conforme pressinto, não aparece em nosso destino como um
estranho, um aventureiro que nos roube as melhores ensanchas da vida. É velho
amigo que tem com o nosso o seu destino entrelaçado.
Desejavas nascer nas minhas carnes,
recordo-me, como resultado da ilicitude para atormentar, vingar, e
atormentar-te... Jesus nos permite a realização do teu desejo, não como
gostarias, mas como de dever. Serás nosso filho num matrimônio honrado e
voltarás aos braços de papai, como o neto que o amará e dele receberá muito
amor. Também ele mudou. Tu também mudaste. Todos nós mudamos. Agora tudo é
diferente, muito diferente...
Guilherme deixou-se conduzir por
aquela voz de terna bondade e se rendeu ante a força do amor verdadeiro.
Ambrósio foi tomar Dona Rosa e o Sr.
Mateus e os trouxe ao grupo em confabulação.
A veneranda senhora fitou o Irmão
Glaucus, que lhe compreendeu o desejo íntimo, assentindo, com um leve sorriso.
A matrona tocou o futuro neto com
mãos delicadas e disse:
— Serás, meu filho, a alegria da
nossa velhice, como foste a preocupação dos nossos dias já passados. Eu terei
em ti o sorriso do meu coração fatigado e Mateus encontrará na tua irrequietude
juvenil os motivos de júbilos que por muitos anos o seu coração dorido não experimentou.
Também ele tem sofrido muito e espera que as tuas mãos, quando pequeninas no
corpo, lhe enxuguem os suores e as muitas lágrimas que verterá. Ver-te-á como
alguém que irrompe de um passado longínquo, sedento de amor e amoroso também...
O Sr. Mateus, sem palavras, meio
acanhado, canhestramente tocou o antigo adversário e permaneceu mudo.
O Irmão Glaucus interveio:
— Todos se reencontrarão mais tarde,
como chegados de um sonho impreciso, de contornos confusos; no entanto, com
lembranças queridas desta madrugada ainda imersa em trevas, em que confabulamos
e delineamos nosso porvir redentor.
Guilherme será conduzido a
necessário tratamento em Organização especializada, do lado de cá, e receberá
preparação para o tentame próximo. Foram separados, retornando aos seus
lugares.
O Irmão Glaucus tomou o antigo Mago
de Ruão, que se apresentava desfeito, contraído, com indizível sofrimento
estampado na face, e o aproximou de Ana Maria. Tocando a jovem, falou-lhe:
— Devolvo-te o amor não fruido.
Tê-lo-ás no seio materno e nos braços da ternura. Amamentá-lo-ás e lhe
fornecerás a forma orgânica. Ele, porém, terá incontáveis limitações de muita
natureza, exigindo-te sacrifícios e vigílias. Talvez não consiga firmar-se na
primeira tentativa de renascimento. Os seus fluídos possivelmente intoxicarão
venenosamente a forma débil do feto... Mas voltará, sim, aos teus anelos, às
tuas ansiedades. Antes dormirá demorado sono em nossa Esfera de ação, para
esquecer e recomeçar sem o peso das lembranças causticantes... Teu amor
ajudá-lo-á a carregar o fardo das próprias dores. Não seguirás a sós: teus
Amigos Espirituais te ajudarão, todos oraremos por ti e por ele.
Ana Maria tocou a face do inditoso
afeto. Misturou as suas nas lágrimas dele, que fluiam silenciosas e doloridas.
— Ajuda-me, amado Teo — disse lenta,
lacônicamente. — Ajuda-me com o teu vigor, o teu entusiasmo e a tua sabedoria,
tu que sempre foste mais eloquente do que eu. Socorre-me com a tua presença e
não me deixes mais sozinha... pois eu não suportaria, agora que te reencontrei.
— Pede-o a Deus — respondeu,
lamentoso e débil —, não a mim. Eu sou um infeliz, já que tu não caíste tanto,
não te comprometeste tanto quanto eu... Sou agora muito fraco, vencido por mim
mesmo. Roga-Lhe, tu, que serás mãe e a mãe é sempre abençoada. Roga, por nós
dois.
Ana Maria recebia o influxo mental
do Irmão Glaucus, que a inspirava poderosamente. Comovida, a ex-leprosa
retrucou:
— Se somos fracos em forças, nosso
amor é forte em esperança. Nossa fraqueza será nossa resistência, porque nos
dependeremos e, assim, nos ajudaremos.
Seu rosto se descontraiu e ela quase
sorriu. Afagou a fronte suada do seu amor e concluiu:
— Tudo quanto não tivemos, até
agora, o amanhã nos ajudará a possuir. Estaremos mais entrelaçados do que em
qualquer ocasião. Por ti, receberei também, nos braços, a Jean...
— Jean? — interrogou, surpreso, o
Espírito.
— Sim, Jean Villemain, recordas?
Comprometi-me a ajudá-lo, também, e assim nossa felicidade não terá manchas.
Ajudando-o, ajudar-nos-emos. Ele foi mau porque deixou que o seu amor por mim o
enlouquecesse. Guardadas as proporções não foi, também, de loucura, o nosso
amor? Desse modo nos refaremos e marcharemos juntos.
Fortemente impressionada pela
inspiração do Emissário da Luz, arrematou:
— Aprendi, quando estudava o
Evangelho, em criança, em Ruão, este conceito que nunca esqueci: «Quando eu
buscava Deus fora de mim, não O achava; quando o procurava dentro de mim,
tinha-O perdido; resolvi amar e ajudar o meu próximo e deparei-me comigo, com
Deus e com o meu irmão. Buscando Jean e o ajudando, achar-nos-emos os três na
felicidade...
O irmão Teofrastus assentiu,
cansado, com a cabeça caída sobre o ombro da noiva antes infortunada.
O Benfeitor Glaucus, carinhoso,
elucidou:
— Jean não poderia participar desta
reunião, pois que se encontra em tratamento... Os nossos compromissos
redentores nos desenham, também, aflições e resgates. Não serão incursões
românticas ao jardim das delícias ou aos oásis do repouso. Serão tarefas e
responsabilidades que assumimos perante nós mesmos. Poderemos lograr êxito,
poderemos falhar, dependendo exclusivamente de como refaçamos a senda. O amor
nos ajudará, sem dúvida. Convém recordar, também, que não temos sabido
valorizar devidamente as concessões do amor verdadeiro e, assim, o nosso sonho
de amor será, também, ministério de sacrifício e renunciação, pesados tributos
de dor redentora. Tenhamos em mente a necessidade da oração e do trabalho como
meios de sustentação da fé, nos momentos ásperos que surgirão indubitàvelmente.
Repontarão à nossa frente outros amores e outros desafetos. O nosso pretérito
não está aqui todo representado, definido... Fortaleçamo-nos no bem, pois que
só o bem nos fortalecerá devidamente para os embates porvindouros.
«Roguemos ao Pai que abençoe os
nossos propósitos de luz e respeitemos no porvir a glória da nossa felicidade.
Concentrando-se, demoradamente, o
Benfeitor começou a refletir luz prateada que lhe fluía do cérebro, vestindo-o
totalmente. A sala humilde fez-se brilhante e tínhamos a impressão de que sutil
aroma perfumava o ar. Transfigurado, o Mensageiro orou:
Senhor Jesus, Amigo Excelente:
Chegamos cansados dos caminhos
percorridos,
Trazendo poeira transformada em lama
nos pés da alma,
Sedentos e feridos, de mãos vazias e
dilaceradas;
Tombada, a nossa fronte não se
levamta para olhar o amanhã;
Os ombros arriados não suportam o
fardo das próprias dissipações.
Socorre-nos, Celeste Benfeitor!
Não é a primeira vez que te
esquecemos, envolvendo-nos no crime.
Não é a primeira tentativa que
fazemos com insucesso.
Não é a primeira oportunidade que
perdemos, acoimados pela loucura do «eu».
Apiada-te ainda mais de nós!
Fitamos o céu e nossos olhos não
vêem as estrelas, olhamos o dia e o sol nos enceguece, seguimos a rota e
tropeçamos sem a visão do solo...
Pensamos em ti e brilha em nosso
espírito a Tua luz.
Ampara-nos, Construtor da Vida!
Amanhece o dia do novo ensejo e logo mais mergulharemos no caudaloso rio da
reencarnação.
Reencontraremos as dívidas chamando
por nós e as dores reclamando nos;
Defrontaremos o ódio ultrajando
nossas aquisições de amor e o sofrimento dificultando nosso avanço.
Dá-nos a Tua mão protetora!
Somos o que fomos, ajuda-nos a ser o
que devemos!
A Ti entregamos nossas vidas:
Salva-nos, Jesus, através do
trabalho redentor!
Quando o Mensageiro silenciou,
nossos olhos estavam deslumbrados.
Recebêramos a visita dos Céus para
termos força de prosseguir nos deveres da Terra.
Chegou o momento das despedidas.
De coração túmido abraçamos o nobre
Irmão Glaucus.
Ele sorria gentil e confiante para
todos nós.
O grupo foi sendo reconduzido aos
seus lares.
Os irmãos que se reencarnariam foram
atendidos por Assistentes Espirituais diversos que participaram das inúmeras
tarefas e transferidos para o Mundo Maior.
Saturnino e Ambrósio conduziram-nos
ao lar, assim como os demais membros do labor desobsessivo.
O manto da noite estava sendo
erguido pelo ouro do sol e as nuvens brincavam de sombra e claridade na festa
do Dia.
O perene amanhã com Jesus esperava
por nós.
Fim
QUESTÕES
PARA ESTUDO
1
– Reunidos todos os protagonistas desta história, o que ficou programado para o
ex-obsessor Guilherme? De certo modo, seu antigo plano se concretizava, porém
sob nova perspectiva. De que modo?
2
– E quanto a Dr. Teofratus e Jean Villemain?
3
– Por que, segundo o benfeitor Glaucus, a primeira tentativa de Dr. Teofratus
de reencarnação poderia não ter sucesso? E como possivelmente seria sua nova
reencarnação?
Bom
estudo a todos!!
Equipe
Manoel Philomeno
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