quarta-feira, 24 de abril de 2013

Revista Espírita: Conversas familiares de além-túmulo - Voltaire e Frédéric

Agosto de 1859
 
Diálogo obtido por intermédio de dois médiuns servindo de intérpretes à cada um desses dois Espíritos, na sessão da Sociedade de 18 de março de 1859.
Questões preliminares endereçadas a Voltaire.
1. Em que situação estais como Espírito? - R. Errante, mas arrependido.
2. Quais são as vossas ocupações como Espírito? - R. Eu rasgo o véu do erro que, em minha vida, acreditava ser a luz da verdade.
3. Que pensais de vossos escritos em geral? - R. Meu Espírito estava dominado pelo orgulho; depois, eu tinha uma missão de arrojo a dar a um povo na infância; minhas obras são dela as conseqüências.
4. Que direis, em particular, de vossa Jeanne D’Arc? - R. Esta foi uma diatribe; fiz mais ruim que isso.
5. Quando vivo, que pensáveis de vosso futuro depois da morte? - R. Eu não acreditava senão na matéria, vós bem o sabeis, e ela morre.
6. Éreis ateu no verdadeiro sentido da palavra? - R. Eu era orgulhoso; eu negava a divindade por orgulho, é do que sofro e do que me arrependo.
7. Gostaríeis de conversar com Frédéric, que também consentiu em responder ao nosso apelo. Essa conversa seria instrutiva para nós. - R. Se Frédéric o quer, eu estou pronto.
Voltaire. - Vedes, meu caro monarca, que reconheço meus erros e que estou longe de falar como nas minhas obras; outrora dávamos o espetáculo de nossas torpezas; agora somos obrigados a dar o de nosso arrependimento e do nosso desejo de conhecer a grande e pura verdade.
Frédéric. - Eu vos acreditava menos bom do que não o sois realmente.
Voltaire. - Uma força que somos obrigados a adorar, e reconhecer toda soberana, força nossa alma a proclamar para aqueles que talvez abusamos, uma doutrina toda oposta àquela que professamos.
Frédéric. - É verdade, meu caro Arouet, mas não finjamos mais, é inútil, todos os véus caíram.
Voltaire. - Deixamos tantos desastres atrás de nós, que nos seriam necessárias muitas lágrimas para deles obter o perdão e nos absolver! Não saberíamos muito nos unir para fazer esquecer e reparar os males que causamos.
Frédéric. - Confessemos também que o século que admirávamos foi bem pobre em julgamento e que é preciso pouca coisa para deslumbrar os homens: nada mais que um pouco de audácia.
Voltaire. - Por que não? Fizemos tanta fama em nosso século!
Frédéric. - Foi essa fama que, caindo de repente num completo silêncio, nos lançou de novo na reflexão amarga, quase no arrependimento. Eu choro minha vida, mas também sinto falta de não ser mais Frédéric! E tu de não seres mais o senhor de Voltaire!
Voltaire. - Falai, pois, por nós, Majestade.
Frédéric. - Sim, eu sofro; mas não repitais mais.
Voltaire. - Mas abdicais, pois! Mais tarde fareis como eu.
Frédéric. - Eu não posso...
Voltaire. - Pedis-me para ser vosso guia; eu o serei ainda; tratarei somente de não vos perder no futuro. Se podeis compreender, procurai aqui o que pode vos ser útil. Não são mais altezas que vos interrogam, mas Espíritos que procuram e acham a verdade com a ajuda de Deus.
Frédéric. - Tomai-me, pois, pela mão; traçai-me uma linha de conduta, se o puderdes... esperemo-la... mas isso será por vós... por mim estou muito perturbado, e eis que isso dura um século.
Voltaire. - Deixais-me, ainda, a inveja de ter orgulho de valer melhor que vós; isso não é generoso. Tornai-vos bom e humilde, para que eu mesmo seja humilde.
Frédéric. - Sim, mas a marca que a minha qualidade de Majestade me deixou no coração, impede-me sempre de me humilhar como tu. Meu coração está fechado como um rochedo, árido como um deserto, seco como a arena.
Voltaire. - Serieis, pois, poeta? Não vos conhecia esse talento, Senhor.
Frédéric. - Tu finges, tu... Não peço a Deus senão uma coisa, o esquecimento dç passado... uma encarnação de prova e de trabalho.
Voltaire. - E melhor unir-me também a vós, mas sinto que esperarei por muito tempo minha remissão e o meu perdão.
Frédéric. - Bem, meu amigo, pecamos, pois, juntos uma vez.
Voltaire. - Eu o faço sempre, desde que Deus se dignou levantar para mim o véu da carne.
Frédéric. - Que pensas desses homens que nos chamam aqui?
Voltaire. - Eles podem nos julgar, e nós não podemos senão nos humilharmos com eles.
Frédéric. - Eles me incomodam, eu... seus pensamentos são muito diferentes.
P. (a Frédéric.) - Que pensais do Espiritismo? - R. Sois mais sábios que nós; não viveis um século depois de nós? E embora no céu desde esse tempo, não fazemos apenas senão nele entrar.
P. Nós vos agradecemos por consentirdes em vir ao nosso chamado assim como ao vosso amigo Voltaire.
Voltaire. - Viremos quando quiserdes.
Frédéric. - Não me evoqueis freqüentemente... Não sou simpático.
P. Por que não sois simpático? - R. Eu desprezo e me sinto desprezível.



25 de março de 1859.
1. Evocação de Voltaire. - R. Falai.
2. Que pensais de Frédéric, agora que não está mais aí. - R. Ele raciocina muito bem, mas não quis se explicar; ele despreza, esse desprezo que tem por todo o mundo impede-o de consagrar-se, temeroso de não ser compreendido.
3. Pois bem! Teríeis a bondade de supri-lo, e dizer-nos o que entendia por essas palavras: Eu desprezo e me sinto desprezível? -R. Sim; sente-se fraco e corrompido como nós todos, e compreende, talvez mais do que nós ainda, tendo mais abusado que outros dos dons de Deus.
4. Como o julgais como monarca? - R. Hábil.
5. Julgai-o homem honesto? - R. Não se pode perguntar isso; não conheceis suas ações?
6. Não poderíeis dar-nos uma idéia mais precisa, do que não o fizestes, de vossas ocupações como Espírito? - R. Não; em todo instante de minha vida, descubro como um novo ponto de vista do bem; trato de praticá-lo, ou antes de aprender a praticá-lo. Quando se teve uma existência como a minha, há muitos preconceitos a combater, muitos pensamentos a repelir ou a mudar completamente, antes de chegar à verdade.
7. Desejaríamos ter de vós uma dissertação sobre um assunto de vossa escolha; gostaríeis de dar-nos uma? - R. Sobre o Cristo, sim, se quiserdes.
8. Será nesta sessão? - R. Mais tarde; esperai; em uma outra.
8 de abril de 1859
1. Evocação de Voltaire. - R. Estou aqui.
2. Teríeis a bondade de nos dar hoje a dissertação que nos prometestes? - R. O que vos prometi, posso cumpri-lo aqui; somente abreviarei.
Meus caros amigos, quando estava entre vossos pais, tinha opiniões, e para sustentá-las e fazê-las prevalecer entre meus contemporâneos, freqüentemente, simulei uma convicção que não possuía em realidade. Foi assim que, querendo enfraquecer os defeitos, os vícios nos quais caía a religião, sustentei uma tese que hoje estou condenado a refutar.
Ataquei muitas coisas puras e santas, que minha mão profana deveria respeitar. Assim, ataquei o próprio Cristo, esse modelo de virtudes sobre-humanas, depois eu disse: sim, pobres homens, talvez rivalizemos um pouco o nosso modelo, mas não teremos jamais o devotamento e a santidade que mostrou; ele sempre estará acima de nós, porque foi melhor antes de nós. Estávamos ainda mergulhados no vício da corrupção e ele já estava sentado à direita de Deus. Aqui, diante de vós e o retrato do que a minha pena escreveu contra o Cristo, porque eu o amo, sim eu o amo. Sentia não tê-lo feito ainda.

Fonte: www.espirito.org.br

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