terça-feira, 17 de novembro de 2015

Livro em estudo: Nos Bastidores da Obsessão – Editora FEB –1970 - A011 –– A família Soares - Cap. 1

Livro em estudo: Nos Bastidores da Obsessão – Editora FEB - 1970

Autor: Espírito Manoel Philomeno de Miranda, psicografia de Divaldo Pereira Franco

A011 –– A família Soares - Cap. 1

A família Soares

Terminados a leitura evangélica e o competente co­mentário tecido em breves considerações, o dirigente da reunião proferiu expressiva oração, através da qual, sensivelmente emocionado, rogou o auxílio das Esferas Su­periores para a tarefa da desobsessão.

Aqueles trabalhos faziam parte do programa de so­corro a que se afervorava, havia duas décadas, o irmão José Petitinga.

No santuário em que se desenvolviam os labores fraternais, o odor da caridade sempre impregnava os sofredores de ambos os lados da vida, que ali aporta­vam angustiados e afligidos.

Incorporando, o Benfeitor Saturnino ofereceu as pa­lavras de consoladora confiança com que habitualmente traçava as ligeiras diretrizes no ato da abertura da ses­são, atestando o concurso eficiente dos Obreiros da Es­piritualidade, e, dirigindo-se à irmã Amália, arrancou-a das cogitações dolorosas que a constringiam.

Experimentando singular amargura, a jovem tinha o semblante sulcado de dor e o espírito singularmente trucidado...

Através de expressões carinhosas e alentadoras, o Instrutor Espiritual esclareceu que fora programada para aquela noite a visita de indigitado perseguidor, vinculado pelo pretérito delituoso à família Soares, ali represen­tada, naquele momento, pela moçoila comovida.

— Desde às vésperas — explicou, solícito —, fora providenciado o socorro a Mariana, mais intimamente afinada com o visitante, que logo se utilizaria da mediunidade psicofônica, em incorporação atormentada, tendo em vista as circunstâncias do drama em anda­mento, que poderia colimar numa tragédia irremissível.

Para consubstanciar o labor da noite — prosseguiu, gentil —, levaram-se em conta os títulos de amor gran­jeados por Amália e sua genitora entre os Dirigentes Espirituais da Casa.

Em verdade, Dona Rosa desde há muito experimen­tava pesado fardo de aflições sem nome, que a esma­gava lentamente. Muito jovem consorciara-se com atormentado moço que, invigilante e descuidado dos nobres deveres da família, permanecia ligado psiquicamente a vigorosos sicários desencarnados que o perseguiam sem trégua...

Cobradores impiedosos seduziram-no desde cedo, le­vando-o a desenfreada jogatina, premeditando, soezes, um dia assassiná-lo, através de uma sortida policial no antro em que se refugiava para o cultivo da viciação danosa com outros não menos atormentados comparsas, programa esse em andamento...

Embora as dificuldades financeiras a que se via ata­do, na condição de genitor de seis filhos necessitados de assistência e melhor orientação, deixava-se ficar, des­cuidado, noites a fio entre a expectativa de um lucro imaginoso e ilícito e a perspectiva de uma fortuna impossível e desonesta. Enquanto minguavam os recursos provenientes de modesta aposentadoria, não se esforçava ele por completar as poucas moedas com expedientes extras ou exercitando outra profissão.

Tal desequilíbrio do Sr. Mateus se manifestara des­de muito cedo, em plena juventude. Todavia, com o re­nascimento de Mariana, na condição de sua filha, estranha recordação como que desatrelara reminiscências semi-apagadas que o venciam implacavelmente, fazendo irrespirável a atmosfera do lar, nos breves períodos de tempo que ali passava, agravando-se, à medida que a menina crescia, e que ora culminava em ódio surdo e recíproco, a explodir com frequência crescente, em amea­ças infelizes que chegavam a graves cometimentos de parte a parte.

A mãe aflita desde algum tempo se iniciara nas li­ções consoladoras do Espiritismo, conduzindo Amália, a mais dócil dos filhos, às fontes generosas e cristalinas do Evangelho Restaurado.

Nos ensinamentos confortadores em torno das leis de causa e efeito, as duas encontravam respostas leni­ficadoras para as ulcerações morais que dilaceravam o lar amargurado, sustentando-as nas lutas de todos os dias.

Afervoradas e humildes participavam dos serviços de socorro aos desencarnados na União Espírita Baiana sob a carinhosa direção do irmão Petitinga, que lhes minorava, também, as aflições, com mãos generosas e cristãs.

Naquela noite, todavia, Dona Rosa fora constran­gida a ficar em casa, crucificada por superlativa ago­nia, aguardando o retorno de Mariana, que após lamen­tavel atrito com o pai obsidiado se evadira, rebelde, entre azedas ameaças e injustificadas atitudes, aban­donando o calor doméstico, desfigurada pelo ódio e pela insensatez, embora os dezesseis anos de idade não com­pletos.

Orando, e tendo entregue as dores ao Senhor, a mãe se deixara ficar no lar, enquanto Amália acorrera, sofrida e preocupada, ao serviço da caridade, sufocando as próprias lágrimas, dominada por incoercíveis pressá­gios. O Templo Espírita de comunhão com o Alto era a sua esfera de luz, abençoado reduto de consolo, no qual hauria energias para prosseguir através dos péla­gos das provações rudes, conquanto necessárias ao pró­prio burilamento.

Feito o preâmbulo elucidativo em ligeiras nótulas, o instrutor solicitou a indispensável concentração, desli­gando-se do médium Morais, por cuja faculdade psico­fônica deveria comunicar-se o inditoso perseguidor fa­miliar.

Morais era dedicado médium de psicofonia incons­ciente, que se oferecia com expressivo carinho para o socorro aos desencarnados. Aliara à mediunidade bem disciplinada excelente disposição ao trabalho da cari­dade entre os atormentados da Terra. Aprendera com os Benfeitores Espirituais que o mais eficiente caminho para o aprimoramento das faculdades mediúnicas ainda é o exercício constante das qualidades morais, através da prática do bem indiscriminado e incessante. Assim, educara-se na discrição ante as dificuldades do próximo e transformara-se em cireneu de muitos seres caídos na luta. Por essa razão, havia nele os requisitos indispensáveis ao exercício salutar da mediunidade, especialmente quando Saturnino trazia à doutrinação Entidades infe­lizes ou perversas.

De semblante transfigurado em máscara de esga­res agônicos, o médium incorporou atro ser que, entre blasfêmias e expressões vulgares, exprobrava o cometimento de o trazerem ali contra a sua vontade...

— Farei justiça — exclamou, espumejante. — A justiça sairá das minhas próprias mãos. Judeu Asavero, tenho jornadeado sem descanso, após traído, a sorver essa imensa e intérmina taça de fel e fezes que me en­venena sem aniquilar-me...

Envolvido carinhosamente pelos fluídos de Satur­nino, o doutrinador, particularmente emocionado, dirigiu-se ao comunicante, falando-lhe da renúncia e do perdão como bases para a edificação da felicidade.

— O ódio — asseverou, Petitinga, bondoso — ter­mina por vencer os que o cultivam. Tóxico letal tem sua fonte na rebeldia que o vitaliza até que o amor, nas bases em que o vivia Jesus, lhe extinga a nascente.

— Nunca perdoarei! — explodiu em atroada cons­trangedora. — O perdão é fraqueza inominavel! Para os que encontraram na vingança a única razão de exis­tir, a simples idéia do perdão é qual raio fulminante, que carboniza... Nunca perdoarei, mesmo que destruin­do seja destruído...

— Não, meu irmão — redargüiu, pausado, o ins­pirado doutrinador. — Nada se acaba. A vida não ces­sa. Encerra-se um ciclo numa faixa de evolução para reaparecer noutra e desenvolver-se mais além. Destruir é mudar a aparência de uma forma para renascer nou­tra. Embora ignorando as suas razões, as quais, toda­via, não justificam o tornar-se infeliz, distribuindo ran­cor e trucidando com tenazes de vindita aqueles que se situam sob o comando da sua mente desarvorada, encorajamo-nos a lembrá-lo da compaixão. Recorde-se daqueles que serão vítimas da sua loucura, quando desejando ferir o seu desafeto irá, também, por sua vez, dilacerar os sentimentos dos que amam o seu antigo ofensor... Não lhe comovem as lágrimas, as vigílias intérminas nem a vida trucidada de uma mãe por expec­tativas dolorosas? Teria você colocado no peito uma fornalha ardente em substituição ao coração que ama?

— O amor — refutou, congestionado — é poesia para os que se comprazem nas ilusões do corpo...

— O ódio, porém — considerou o evangelizador —, é nuvem que tolda a visão da paisagem, entenebrecen­do-a. Fantasma truanesco entorpece as mais altas as­pirações do espírito humano, conduzindo-o aos sombrios e intérminos corredores da loucura, sem paz nem lume... Só o amor derrama sol nas almas, penetrando de espe­ranças os seres. Experimente amar e, de pronto, per­ceberá diminuir a própria dor.

— Amar? — exclamou, alucinado — Amor? Como amar se não poderei perdoar nunca, pois que jamais conseguirei esquecer todo o mal que me fizeram os trai­dores desalmados, cuja memória abjuro! A dor que me crucia fez-me perder a noção do tempo e a realidade da vida. Meu viver transformou-se apenas no intérmino buscar daqueles que me fulminaram, impiedosos, sem me terem destruído, o que teria sido bênção em relação ao que padeço. Certamente que eles esqueceram, sim... Eu, porém, nunca esqueci, jamais esquecerei!... Desde que se acumpliciaram os dois para aniquilar-me — o que não conseguiram, sem dúvida —, que a minha vida foi destroçada para sempre. A morte, que eu esperava ser um lenitivo, quando fugi com o espírito pisoteado de vergonha e dor, em nefando suicídio, ao invés de fa­zer-me desintegrar a consciência, mais ativou-a... Te­nho chorado, e o pranto se transforma em aço derre­tido, escaldante, rasgando-me a face. Quando gritava, minha voz era recebida com doestes e zombarias inomináveis por mil seres que me perseguiam... E a dor que me despedaçava foi adicionada à dor acerba do su­plício que me impusera para fugir... Morri sem mor­rer... E enquanto a vermina me penetrava o recesso do espírito fustigado por mil dores, eles, os meus algozes, gozavam, fruíam a juventude... Como se eu esti­vesse dirigido por duendes sem entranhas, era arrasta­do, em alucinada desesperação, para junto deles, de modo a vê-los, acompanhá-los, ouvi-los, e se me lan­çava sobre ambos e lhes gritava a minha infinita des­dita, os seus ouvidos não me escutavam... Oh!, nunca poderei esquecer, perdoar, amar, nunca, nunca!...

O irmão Saturnino, semi-incorporado no venerando doutrinador, ergueu-o, e, dirigindo-se ao perturbador­-perturbado, em oração, começou a aplicar-lhe passes, de modo a diminuir-lhe as agudíssimas exulcerações e torturas.

Branda claridade envolveu o comunicante, enquan­to as mãos de Saturnino, justapostas às de Petitinga, como depósitos de radiosa energia, que também se exteriorizava do plexo cardíaco do passista, lentamente pe­netrou os centros de força do desencarnado, como a anestesiar-lhe a organização perispiritual em desalinho.

Com voz compassiva, o diretor dos trabalhos come­çou a exortar:

Durma, durma, meu irmão... O sono far-lhe-á bem. Procure tudo esquecer para somente lembrar-se de que hoje é novo dia... Durma, durma, durma...

Banhado pela energia balsamizante e dominado pe­las vibrações hipnóticas que fluíam de Saturnino atra­vés de Petitinga, o perseguidor foi vencido por estra­nho torpor, sendo desligado do médium por devotados assessores desencarnados, que cooperavam no serviço de iluminação.

Prosseguindo os trabalhos de orientação, tendo em vista outros sofredores desencarnados e antes do térmi­no da reunião, o Mentor voltou a incorporar-se para es­clarecer que, graças às bênçãos do Senhor, a primeira etapa do programa de assistência à família Soares, na­quela noite, fora coroada de êxito. Exortava todos à oração intercessória, em benefício dos implicados naque­le processo, prometendo voltar ao problema na próxima oportunidade.

Proferida a oração gratulatória, foi encerrada a reunião.­

QUESTÕES PARA ESTUDO

1) Que tipo de sofrimento apresentava a família Soares, neste primeiro capítulo?

2) Que tipo de atividade o Sr Mateus se envolvia? Sua conduta favorecia a atuação do obsessor? Por quê?

3) Que “requisitos” Morais possuía para o êxito no trabalho mediúnico?

4) Qual era o discurso do obsessor na reunião mediúnica? Que tipo de argumentos o doutrinador utilizava para ajudá-lo?

Bom estudo a todos!!

Equipe Manoel Philomeno

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