Medo de errar?! Por quê?
Por Cristiane Maria Lenzi
Fonte: Jornal Mundo Espírita
Desde quando a sociedade humana vem propagando o medo diante dos erros cometidos? Difícil dizer… O próprio conceito de pecado vem sendo disseminado há tempos, irrefletidamente, como comportamento feio, praticado por pessoas más. Por causa disso, fazemos o possível para não sermos pegos pecando, nem que precisemos esconder ou atribuir nossos erros a outros.
O pecado nos leva ao inferno. Acreditamos nisso desde há muitas vidas. Mas seriam realmente nossos erros que nos aprisionariam a estados infernais de dor e sofrimento? Ou seria a forma como lidamos com os erros que nos costuma paralisar em torturas emocionais?
A Doutrina Espírita nos ensina que:
(…) Os sofrimentos que decorrem do pecado são-lhe [ao ser humano] uma advertência de que procedeu mal. Dão-lhe experiência, fazem-lhe sentir a diferença existente entre o bem e o mal e a necessidade de se melhorar para, de futuro, evitar o que lhe originou uma fonte de amarguras; sem o que, motivo não haveria para que se emendasse. Confiante na impunidade, retardaria seu avanço e, consequentemente, a sua felicidade futura.1
Allan Kardec, então, nos ofereceu a oportunidade de ampliar a consciência a respeito dos erros cometidos, compreendendo que:
- o erro faz parte do processo de evolução espiritual, a partir do momento em que o ser humano passa a utilizar o livre-arbítrio;
- o erro gera situações incômodas como forma de advertência a respeito dos caminhos a serem evitados;
- o erro promove crescimento ao oferecer oportunidade de nos responsabilizarmos pelas suas consequências.
Dessa forma, quando nos depararmos com afirmações populares como: Errou?! Agora sofra!, limitando todo um processo pedagógico em apenas duas fases: errar e ser punido, devemos nos vigiar para mantermos nossa consciência mais ampla do que esse atavismo propõe.
Isso porque, ao focarmos nossa atenção apenas nessas duas etapas: errar e sofrer, descartamos outra parte do processo de aprendizagem espiritual, ainda mais importante: a experiência em si!
Não é difícil constatarmos que, ao polarizarmos nossa atenção somente no resultado: certo ou errado; bem ou mal; deixamos de notar o que aprendemos durante a experiência vivenciada: o que sentimos; o que observamos; o que concluímos; independentemente do final atingido. Ou seja, mais interessante do que a linha de chegada, para o desenvolvimento espiritual, é o caminho percorrido. É durante o trajeto que crescemos, acertando ou errando, sorrindo ou sofrendo.
Por isso muitas vezes dizemos: Por mais que eu tenha sofrido com o erro cometido, também percebo que foi exatamente aquela experiência que me fez crescer e chegar onde estou.
Por isso, talvez, o medo de errar esteja sendo, ao longo de gerações e gerações, supervalorizado. Há tantas pessoas que passam por caminhos equivocados, sem medo e lidando bem com as respectivas responsabilidades. É como se soubessem errar.
Quem sabe as pessoas mais temerosas diante da possibilidade de pecarem sejam aquelas que ainda não aprenderam como errar, nem perceberam a finalidade positiva do erro, caso seja cometido. Elas vêm errando de forma errada!
Parece que pecado, então, não seria o erro em si, mas o processo de errar errado, ou seja, ao invés de aceitarmos o erro (fruto da ignorância) com naturalidade, como mecanismo de reavaliação de curso de vida, corrigindo a rota ou reparando o que for preciso, ficamos estagnados nele, caindo na lamentação e nos sentindo perdedores por havermos errado ou temendo suas consequências infernais.
Certamente Deus não imaginou assim o caminho da evolução, imputando medo aos Seus filhos, para que não pecassem jamais. Faz mais sentido que os Planos Divinos sejam algo do tipo: Filhos, vivam, experimentem, aprendam... pois, pensando nEle como Pai amoroso e perfeito, não parece que nos perguntaria: Filho, você acertou? Ou errou de novo?, mas que nos proporia uma conversa mais educativa, como: Filho, o que você aprendeu com essa experiência?, independentemente do resultado obtido.
Foco no resultado pode ser bom para a área de negócios, mas no Reino de Deus, aproveitar o caminho e aprender com as experiências, sejam acertadas ou erradas, é que nos aproxima dEle. Mais importante, certamente, do que não errar, é saber errar, é errar certo!
* * *
A análise racional do erro e do pecado, do escândalo e do crime cometidos, enseja a consciência da desnecessidade do sofrimento como mecanismo de libertação, oferecendo, em contrapartida, a ação benfazeja, dignificadora, que levanta a vítima e apazigua o algoz, que reorganiza os valores desrespeitados e equilibra o grupo social, facultando bem-estar naquele que temia e agora ama, que se atormentava e ora se acalma.2
Referências bibliográficas:
1 KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 119. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002. cap. V, item 5.
2 FRANCO, Divaldo Pereira. Triunfo Pessoal. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. 8. ed. Salvador: LEAL, 2014. cap. 10.
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