segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Para evitar internação de menores, Justiça reúne vítima com infrator

Para evitar internação de menores, Justiça reúne vítima com infrator

LEANDRO MACHADO
DE SÃO PAULO

O Tribunal de Justiça de São Paulo passou a adotar no final deste ano o método conhecido como justiça restaurativa para resolver conflitos envolvendo adolescentes infratores na capital paulista.
Nesse modelo, agressor e vítima são colocados frente a frente, numa roda, para que o primeiro entenda os traumas e as consequências do seu ato de violência. Depois, as partes tentam entrar em acordo para que o adolescente repare sua infração.
Um dos objetivos é reduzir o número de medidas socioeducativas aplicadas a jovens envolvidos em casos de agressão, bullying e furtos.
Apenas nos cinco primeiros meses deste ano, a Polícia Militar realizou, em média, uma apreensão em flagrante a cada três horas na capital. Nesse período, foram 1.333 casos, ou pouco mais de 10% do total registrado na cidade.
Normalmente, quem comete infrações mais graves, como nos casos de roubo, é alvo de outras ações, como internação na Fundação Casa.
A justiça restaurativa subverte a lógica da punição como forma de combate à violência. Para juízes e promotores da área, encarceramento nem sempre funciona, pois a pena é vista como uma "dívida" a ser paga, e não há reflexão sobre as transgressões.
"A pessoa é presa e não vê sua responsabilidade. Diz 'vou pagar minha pena e sair zerado'", afirma o juiz Egberto Penido.
Na 1ª Vara da Infância e Juventude, no Brás (centro), onde atua, ele faz 20 audiências por dia. "O sistema punitivo não tem sido eficaz. Basta ver os altos índices de reincidência em nossos presídios."
A justiça restaurativa começou a ser aplicada em 2006, em cidades do Estado de São Paulo, do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal.
Na capital paulista, iniciou com casos de menor gravidade da Brasilândia, na zona norte. Policiais e professores de nove escolas foram treinados com conceitos do modelo ao longo deste ano.
Agora, o tribunal e o Ministério Público de SP esperam expandi-lo para outros locais e aumentar o alcance das infrações - poderia ser aplicado em roubos, normalmente em casos sem reincidência.

CONSCIÊNCIA
O procedimento da justiça restaurativa começa com uma consulta à vítima do crime. Técnicos do TJ perguntam se ela aceita participar de um "círculo restaurativo". A reunião é uma espécie de autoanálise com participação do infrator, vítima, parentes e membros da comunidade. O juiz não comparece.
Nesse encontro, a vítima conta os prejuízos e traumas causados pela ação. Por sua vez, o infrator tenta explicar suas motivações - seus parentes contam um pouco da história de vida da família.
Depois dessa fase, chega-se a um acordo de reparação. Um jovem acusado de furto pode, por exemplo, ter de devolver o valor subtraído, participar de projetos sociais ou fazer uma campanha de conscientização na escola.
"Tomar consciência dos seus erros e dos danos que causou ao outro é um processo doloroso", diz Marcelo Salmaso, juiz em Tatuí (a 141 km de São Paulo). "Há pessoas que desistem e pedem para serem julgadas normalmente."
Tatuí, utiliza o modelo desde 2013. Ana Cristina Galhardo, 43, moradora da cidade, adotou o adolescente Pedro após um processo de justiça restaurativa. Ele assaltou a casa dela com uma arma de brinquedo, roubou um celular e, após ser detido pela polícia, pediu perdão e ambos fizeram um acordo.
O método usa o conceito de corresponsabilidade, ou seja, não só o infrator é o "culpado" por uma transgressão, mas toda a sociedade.
"Se um adolescente faz bullying, ele é o único culpado? Será que ele mesmo já não foi vítima?", afirma o juiz.
Tatiana Callé, promotora da infância em SP, tem esperança de que o sistema reduza a criminalidade. "Muitas vezes, o adolescente vai deixar de praticar infrações mais porque tomou consciência do mal que causou do que pelo medo da punição", diz.
Notícia publicada no Jornal Folha de S.Paulo, em 27 de dezembro de 2016.

Claudia Abreu* comenta
O Capítulo XI de O Evangelho Segundo o Espiritismo, em seu item 14, “Caridade para com os Criminosos”, nos diz: “...Não vos cabe dizer de um criminoso: “É um miserável; deve-se expurgar da sua presença a Terra; muito branda é, para um ser de tal espécie, a morte que lhe infligem.” Não, não é assim que vos compete falar. Observai o vosso modelo: Jesus. Que diria ele, se visse junto de si um desses desgraçados? Lamentá-lo-ia; considerá-lo-ia um doente bem digno de piedade; estender-lhe-ia a mão. Em realidade, não podeis fazer o mesmo; mas, pelo menos, podeis orar por ele, assistir-lhe o Espírito durante o tempo que ainda haja de passar na Terra. Pode ele ser tocado de arrependimento, se orardes com fé. É tanto vosso próximo, como o melhor dos homens; sua alma, transviada e revoltada, foi criada, como a vossa, para se aperfeiçoar; ajudai-o, pois, a sair do lameiro e orai por ele.”
A citação acima nos deixa muito claro que quem está na criminalidade hoje poderá se recuperar amanhã. Como somos espíritos imortais e em processo de evolução, podemos a qualquer momento passar por um processo de conscientização e mudança, nesta ou em outras vidas, nos levando à compreensão real dos nossos atos e responsabilidades, pois cada um tem o seu tempo.
A matéria nos fala em justiça restaurativa para adolescentes que de algum modo transgrediram a lei e prejudicaram de alguma forma o outro. Vejo um ponto forte desse processo restaurativo, a tomada da consciência com a reflexão sobre o ato cometido. A doutrina espírita sempre nos fala da importância da reflexão e de adquirir novos conhecimentos, para que tenhamos condições de refletir sobre tudo o que nos chega, seja através da fala ou da leitura, e isso nos leva ao amadurecimento. Sabemos que muitos desses jovens não tiveram um direcionamento e nem oportunidades de adquirir conhecimentos, pois muitos têm uma realidade muito dura.
É um ótimo método de trabalhar com esses adolescentes transgressores, sem a visão punitiva, mas sim com a tomada da consciência dos seus atos, aprendendo a se colocar no lugar do outro. É um momento importante da vida deles, que muitas vezes apenas estão esperando que alguém lhes estenda a mão.
Esperamos que todos os adolescentes aceitem esse método de conscientização, que o trabalho possa se estender a todas as cidades do país e que a redução da criminalidade chegue e que passe a ser uma constante em nossos dias. E que todos nós possamos acreditar efetivamente na recuperação de quem transgrediu a lei, pois muitas vezes não basta só ele querer, precisa que encontre uma mão estendida pronta a auxiliar.
Claro que há casos bem difíceis, mas, como já falado, cada um no seu tempo. E no mesmo capítulo mencionado acima encontramos o seguinte ensino: “Não julgueis, oh! não julgueis absolutamente, meus caros amigos, porquanto o juízo que proferirdes ainda mais severamente vos será aplicado e precisais de indulgência para os pecados em que sem cessar incorreis. Ignorais que há muitas ações que são crimes aos olhos do Deus de pureza e que o mundo nem sequer como faltas leves considera?”
* Claudia Abreu é espírita e colaboradora do Espiritismo.net.

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