REVISTA
ESPIRITA
JORNAL
DE ESTUDOS PSICOLÓGICOS
6a ANO
NO. 8 AGOSTO 1863
PERGUNTAS
E PROBLEMAS.
Mistificações.
Uma carta
de Locarno contém a seguinte passagem:
"....
Para mim a dúvida seria impossível, uma vez que tenho uma filha, muito bom
médium, e que meu próprio filho escreve; mas, ai! teve tão cruéis
mistificações, que seu desencorajamento me ganhou um pouco, sem, no entanto,
abalar nossa crença tão pura e tão consoladora, apesar dos desgostos que se
sente quando se vê enganado por respostas falazes. Por que, pois, Deus permite
que aqueles que têm boas intenções sejam assim enganados por aqueles que
deveriam esclarecê-los?..."
Resposta.
- O mundo corpóreo se derrama pelo
mundo espírita pela morte, e o mundo espírita se derrama no mundo corpóreo pela
encarnação, e disso resulta que a população normal do espaço que cerca a Terra
se compõe de Espíritos provindos da Humanidade terrestre; essa Humanidade,
sendo uma das mais imperfeitas, não pode dar senão produtos imperfeitos; é a
razão pela qual os maus Espíritos pululam ao seu redor. Pela mesma razão, nos
mundos mais avançados, naqueles onde o bem reina sem partilha, não há senão
bons Espíritos. Estando isto admitido, compreender-se-á que a ingerência tão
freqüente dos maus Espíritos nas relações medianímicas é inerente à
inferioridade de nosso globo; aqui corre-se o risco de ser vítima dos Espíritos
enganadores, como num país de ladrões corre-se o risco de ser roubado. Não se
poderia também perguntar por que Deus permite que as pessoas honestas sejam
despojados pelos gatunos, vítimas da malevolência, alvo de todas as espécies de
misérias? Perguntai antes por que estais sobre essa Terra, e vos será
respondido que é porque não merecestes uma morada melhor, salvo os Espíritos
que aqui estão em missão; é preciso, pois, sofrer-lhes as conseqüências e fazer
seus esforços para dela sair o mais cedo possível. À espera disso, é preciso se
esforçar por se preservar dos ataques dos maus Espíritos, o que não se chega
senão fechando-lhes todas as saídas que poderiam lhes dar acesso em nossa alma,
impondo-se-lhes pela superioridade moral, a coragem, a perseverança e uma fé
inabalável na proteção de Deus e dos bons Espíritos, no futuro que é tudo, ao
passo que o presente não é nada. Mas como ninguém é perfeito sobre a Terra,
ninguém pode se gabar, sem orgulho, de estar ao abrigo de suas malícias de
maneira absoluta. A pureza das intenções é muito, sem dúvida; é o caminho que
conduz à perfeição, mas não é a perfeição, e pode aí ter ainda, no fundo da
alma, algum velho fermento; é porque não há um único médium que não haja sido
mais ou menos enganado.
A simples
razão nos diz que os bons Espíritos não podem fazer senão o bem, de outro modo
não seriam bons, e que o mal não pode vir senão dos Espíritos imperfeitos;
portanto, as mistificações não podem ser senão o fato de Espíritos levianos ou
mentirosos que abusam da credulidade, e freqüentemente exploram o orgulho, a
vaidade ou outras paixões. Essas mistificações têm por objetivo pôr à prova a
perseverança, a firmeza na fé, e de exercer o julgamento. Se os bons Espíritos
as permitem, em certas ocasiões, isso não é por impossibilidade de sua parte,
mas para nos deixar o mérito da luta: sendo a mais proveitosa a experiência que
se adquire às próprias custas; se a coragem dobra, é uma prova da fraqueza que
nos deixa à mercê dos maus Espíritos. Os bons Espíritos velam sobre nós, nos
assistem e nos ajudam, mas com a condição de que nos ajudaremos a nós mesmos. O
homem está sobre a Terra para a luta, e lhe é preciso vencer para dela sair,
senão ele aqui fica.
Infinito
e indefinido.
Escrevem-nos
de São Petersburgo, a primeiro de julho de 1863:
"...
Em O Livro dos Espíritos, livro l, capítulo 1o, no 2,
anotei esta proposição: Tudo o que é desconhecido é infinito. Parece-me
que muitas coisas nos são desconhecidas sem por isso serem infinitas.
Encontrando-se essa palavra em todas as edições, pedi sua explicação ao meu
guia, que me respondeu: "A palavra infinito é aqui um erro; é
preciso indefinido." Que pensar disso?...
Resposta.
Essas duas palavras, embora sinônimas
pelo sentido geral, têm cada uma acepção especial. A Academia as definiu assim:
Indefinido,
cujo fim, os limites não podem ser
determinados. Tempo indefinido. Número indefinido. Linha indefinida. Espaço
indefinido.
Infinito,
que não tem começo nem fim, que é sem
marco e sem limites. O espaço é infinito. Deus é infinito. A misericórdia de
Deus é infinita. Diz-se, por extensão, daquilo em que não se podem
assinalar os marcos, o termo, e, por exagero, tanto no sentido físico quanto no
sentido moral, de tudo o que é muito considerável em seu gênero. Diz-se
particularmente por inumerável. Uma duração Infinita. A beatitude infinita
dos eleitos. Dos astros colocados a uma distância infinita. Eu vos sei de uma
vontade infinita. Uma infinita variedade de objetos. As penas infinitas. Há um
número infinito de autores que escreveram sobre este assunto.
Resulta daí
que a palavra indefinido tem o sentido mais particular, e a palavra infinito
um sentido mais geral; que o primeiro se diz antes em relação às coisas
materiais e o segundo das coisas abstratas: é mais vago do que o outro. O
sentido mais geral da palavra infinito permite aplicá-la em certos casos
ao que não é senão indefinido, ao passo que o inverso não poderia
ocorrer. Diz-se igualmente: uma duração infinita e uma duração indefinida; não
se poderia dizer: Deus é indefinido, sua misericórdia é indefinida.
Sob esse
ponto de vista, o emprego da palavra infinito na frase precitada não é,
pois, abusivo, e não é um erro. Dizemos, além disso, que a palavra indefinido
não daria a mesma idéia. Do momento que uma coisa é desconhecida, ela tem
para o pensamento o vago do infinito, senão absoluto, pelo menos relativo. Por
exemplo, não sabeis o que vos acontecerá amanhã: vosso pensamento erra no
infinito; são os acontecimentos que são indefinidos; não sabeis o quanto há de
estrelas: é um número indefinido, mas é também o infinito para a imaginação. No
caso do qual se trata, convém, pois, empregar a palavra que generalize o
pensamento, de preferência à que lhe daria um sentido restrito.
Enviado por: "Joel Silva"
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