Livro em estudo: Nos
Bastidores da Obsessão – Editora FEB - 1970
Autor: Espírito Manoel Philomeno
de Miranda, psicografia de Divaldo Pereira Franco
A026 – Cap. 10 – Programação redentora – Primeira Parte
No desdobramento das tarefas
habituais, através das quais eram mantidos os contatos com os Benfeitores
Desencarnados, nas sessões especiais, hebdomadárias, recebíamos
esclarecimentos e informações, através das quais os irmãos Saturnino e Ambrósio
nos davam elucidações minudentes dos acontecimentos transcorridos na Esfera
Espiritual, quando dos labores abençoados de que participávamos, conquanto a
nossa condição de encarnados no domicílio orgânico.
Dessa forma, inteiramo-nos dos
detalhes da operação fraterna junto ao Dr. Teofrastus e a Henriette-Marie,
assim como dos fatos precedentes. Obviamente, ao retornarmos ao corpo somático,
as lembranças das realizações espirituais desapareciam quase completamente,
deixando-nos as evocações em impressões de sonhos que se manifestavam, ora como
pesadelos dolorosos, ora como estados de comunhão elevada com as Esferas
Superiores da Vida. Nesse particular, os Instrutores se encarregavam de
ativar ou frenar os centros encarregados das lembranças, de modo a que a nossa
jornada humana transcorresse com a normalidade possível, sem problemas que nos
perturbassem as atividades de servidores da Comunidade dos homens.
A recordação detalhada situar-nos-ia
entre os dois mundos, ensejando-nos um desapercebimento das realidades do lado físico,
propiciando-nos um desvio da atenção, que se voltaria para as experiências e
realidades da esfera espiritual.
Desde que fora iniciado o processo
desobsessivo de Mariana, recebêramos advertência no sentido de manter as
ligações psíquicas com a Espiritualidade Superior, de modo a nos acautelarmos
das ciladas dos Espíritos menos felizes que, surpreendidos pelas incursões que
se fariam nos seus domínios, seriam concitados à agressão por todos os meios
possíveis, numa tentativa de obstar o labor abençoado ora em execução.
Considerando as altas
responsabilidades que nos diziam respeito, buscávamos corresponder à
expectativa dos Mentores, esforçando-nos por oferecer, pelo menos, a quota da
oração, do pensamento otimista e o espírito de abnegação, dedicando-nos ao
mister espiritual com alta dose de entusiasmo e fé.
Ao primeiro ensejo, após a
entrevista com o ex-Mago de Ruão, o Benfeitor
Saturnino elucidou, pela psicofonia do médium Morais, que voltaríamos a
encontrar-nos, depois de concluídos os trabalhos da noite, quando o Irmão
Glaucus conduziria o terrível obsessor, ora em fase de meditação, a uma
entrevista naquela Casa, num encontro que estava destinado a definir os rumos
futuros da sua vida. Concitava-nos ao exercício e mentalização da piedade
fraternal, manifestação essencial para a caridade legítima, de que nos
deveríamos revestir para cooperar ativamente.
Em retornando ao lar, a expectativa
do reencontro me inquietava, dificultando-me o necessário repouso. Orando, no
entanto, e sentindo a presença dos Irmãos Maiores do Mundo Espiritual,
recompusemos a paisagem mental e brando torpor nos invadiu, facilitando às
Entidades vigilantes o nosso desdobramento e consequente condução à Sede da
nossa Casa de Oração e Amor. Quando ali chegamos, já se encontravam os demais
membros participantes das tarefas socorristas.
Saturnino, sempre calmo e gentil,
traduziu em sentida oração os anseios de todos os presentes e rogou a Jesus
fosse Ele o Sublime Visitante e o Condutor dos trabalhos em desdobramento, com
vistas à caridade da iluminação de consciências obnubiladas pelo orgulho e pelo
egoísmo — esses dois implacáveis inimigos do espírito humano!
O ambiente, à medida que o
Benfeitor orava, se foi saturando de perfume discreto, qual lavanda muito leve
carreada por suave aragem - Pétalas de luz diáfana começaram a cair,
abundantes, e desfaziam-se ao tocar nos circunstantes ou nos diversos móveis e
objetos. Vibrações muito penetrantes nos impregnavam a todos - E sem que o
percebêssemos, as emoções rompiam os diques da visão e fluíam em copiosas
lágrimas, no recolhimento em que nos encontrávamos.
Voltando-se para o irmão Petitinga,
Saturnino solicitou:
— Leia, meu irmão, o «Livro da Vida».
O venerando amigo acercou-se
da mesa mediúnica e tomou de pequeno livro, irisado de filetes de luz, no qual
vimos em tons azul-prateados as letras, em destaque: Novo Testamento.
Abrindo-o ao sabor do momento,
embargado pela emotividade superior da hora, José Petitinga leu as anotações
do apóstolo Marcos, no Capítulo nº 9, versiculos 17 a 29:
«Mestre,
eu te trouxe meu filho, que está possesso dum Espírito mudo, e este, onde quer
que o apanha, o lança por terra: ele espuma, range os dentes e vai definhando.
Roguei a teus discípulos que o espelissem, e eles não puderam. «Disse-lhes
Jesus: «Oh, geração incrédula! até quando estarei convosco? até quando
vos sofrerei? Trazei-mo» Então, lho trouxeram. Ao ver
a Jesus, logo o espírito o convulsionou; ele caiu por terra e se estorceu,
espumando. Perguntou Jesus ao pai dele: — «Há quanto tempo acontece isto?» Respondeu-lhe: — «Desde a infância; e muitas vezes o tem
lançado tanto no fogo como na água, para o destruir; mas se podes alguma coisa,
compadece-te de nós e ajuda-nos. » Disse-lhe Jesus: “Se podes! tudo é possível
ao que crê.» Imediatamente o pai do menino exclamou: «Creio! ajuda a minha
incredulidade.» Jesus, vendo que uma multidão afluia, repreendeu o Espírito imundo, dizendo-lhe: «Espírito mudo
e surdo, eu te ordeno, saí dele, e nunca mais nele entres.» Gritando e
agitando-o muito, saiu; o menino ficou como morto, de maneira que a maior parte
do povo dizia: «Morreu. » Jesus, porém, tomando-o pela mão, ergueu-o, e ele
ficou em pé. Depois que entrou em casa, perguntaram-lhe seus discípulos
particularmente: — «Como é que nós
não pudemos expulsá-lo?» Respondeu-lhes: — “Esta espécie só pode sair à força de oração.»
Fechando o delicado repositório dos
(ditos do Senhor», e, inspirado e comovido, José Petitinga, após ligeira
pausa, teceu comentários vazados na mais excelente conceituação espírita,
revivendo os feitos do Mestre, naquele momento em que deveríamos, aquinhoados
pela mercê do Rabi, concitar à paz e ao arrependimento, um Espírito que,
somente «à força da oração», poderia modificar-se.
Silenciava o apóstolo da mensagem
espírita em terras baianas no passado, quando deu entrada na sala o irmão
Glaucus, que se fazia acompanhar do Dr. Teofrastus e dos dois guardiães que,
com permissão dos Instrutores, ficaram postados à porta do recinto, pelo lado
exterior.
A Entidade visitante trazia o
semblante velado por singular melancolia, Os olhos antes brilhantes, traduzindo
estranha ferocidade, se apresentavam baços, e, como se suportasse invisível
fardo, caminhava tardo, com características mui diversas daquelas que ostentava
até há poucos dias.
Tratado com carinho e respeito pelo
venerável Benfeitor, foi convidado a sentar-se entre nós, na condição de convidado
especial.
O irmão Glaucus, tomando a
palavra, falou sucintamente:
— Tratamos aqui de dar prosseguimento
ao exame dos problemas que dizem respeito a Henriette-Marie e ao seu
perseguidor, que agora se encontra recolhido em recinto de Amor, sob guarda de
devotados servidores do Bem. Não ignoramos que o irmão Teofrastus foi
defrontado por surpresa dolorosa com o resultado da má aplicação do tempo,
passando a experimentar desde então as consequências das atitudes
espontaneamente tomadas. Sabendo-o ligado por profundos laços de afeição à
sofredora, que lhe não pôde fruir a companhia nos últimos tempos, consideramos
de bom alvitre conduzi-lo até onde ela se encontrava, de modo a concertar
planos em relação ao futuro e sustar, em definitivo, as maquinações da
criminalidade até agora em desdobramento.
— Mas, no momento — repostou o
vingador, visivelmente conturbado —, não poderei aquiescer com quaisquer
compromissos que objetivem afastar-me dos muros do meu campo de ação. Estou
vinculado a uma poderosa Organização, e embora em posição de comando sou, por
minha vez, comandado.
— Insistimos em elucidar — replicou,
seguro e calmo, o Benfeitor — que Chefe somente um há: Jesus, o Rei Sublime
das nossas vidas, a Quem devemos as dádivas oportunas da evolução e do
progresso atual, em nossa nova condição de viandantes da luz. Entregando-nos
ao Seu comando afável, nenhuma força possuirá meios de alcançar-nos, porque
sombra alguma, por mais densa, conseguirá suplantar a luz mais insignificante,
submetendo-a...
— Somos, porém — revidou,
algo indeciso —, doze Mentes Dominadoras, que nos encontramos submetidos a uma
equipe de dez Magistrados que habitam Regiões Infernais, onde os mínimos
desvios da Justiça recebem longas punições. Constituímos o grupo dos Doze... Na aplicação do nosso código selecionamos criminosos que alcançam, de nossas mãos, as primeiras correções,
após o que são conduzidos para os presídios próprios, nas furnas, onde levantam
as construções da Cidade da Flagelação...
Ligamo-nos por processo mental especializado e frequentemente somos
convidados, por nossa vez, à prestação de contas, em minudentes relatórios
verbais que são fiscalizados por técnicos competentes e aparelhos sensíveis.
Além disso, as minhas próprias razões me impedem tudo abandonar, para deixar-me
arrastar por sentimentalismos mórbidos, renegando à felicidade em que me
comprazo, sem conhecer, evidentemente, o que se espera de mim. Tudo me é muito
fácil: bastar-me-á arrancar Henriette-Marie da masmorra carnal e retê-la comigo...
— E olvida o amigo —
explicou o irmão Glaucus — que desencarnando a nossa irmã, por constrição obsessiva,
ela escapará das vossas mãos, por ter sido apressada a sua partida, sem que se
possa responsabilizá-la por isso? Ignorais exatamente as «leis de fluídos» e os
processos de «sintonia»? Esqueceis-vos de que toda vítima libra acima dos seus
algozes? Além disso, consideremos que não podemos desprezar a opção do Senhor:
isolá-la da vossa interferência por processos que nos escapam à sagacidade,
mas que pertencem à sabedoria.
Sim, não ignoro — aquiesceu —, mas a
conjuntura que se me apresenta é grave... Amo-a, sempre a amei. Na
impossibilidade de possuí-la, como privar-me do seu amor?
— Deixando-vos possuir —
redarguiu, ameno, o Benfeitor. — O amor é concessão que se manifesta com mil
faces. Não podendo ser-lhe o esposo, conseguireis ser o amado, no seio materno,
na condição de filho da alma e do coração. Fruir-lhe-eis a ternura das mãos e
sugareis o leite vital do seu seio.
Estareis no calor da sua devoção e os vossos olhos se demorarão mergulhados na
luminosidade dos olhos que amam. Permutareis a grande noite da soledade pelo
demorado meio-dia da convivência. Transfundireis todo sentimento de amargura em
expressão de dependência e fé. Derramareis o vaso do ódio, que se converterá
em adubo de produção, no solo da compreensão e da afetividade. Por década de
distância, um tempo sem fim de presença, de imorredoura constância.
— E a lepra? — arguiu.
— A lepra de que parece revestida —
elucidou o Amigo Espiritual — é enfermidade
simulacro, produzida pelas descargas constantes do seu perseguidor desencarnado.
Não desconheceis, amigo Teofrastus, o que conseguem as forças fluídicas
desencadeadas sob o impacto do ódio, e a absorção em longo processo obsessivo
das energias deletérias. De mente consumida pela perturbação que a si mesma se
vem impondo, através das constantes transgressões às Leis de Justiça, nossa
irmã sincronizou com o verdugo que a vítima e, amolentada pelas vibrações
hipnóticas do seu antagonista, começou a experimentar as falsas impressões do
Mal de Hansen — conforme desejo do seu inimigo —, sendo atirada ao presídio-hospitalar
em que vive, em quase total abandono, para que a vindita se coroe da resolução
final, que o sicário aguardava: o suicídio. Estamos, aliás, informados de que
tal plano fora trabalhado pelo próprio amigo Teofrastus, que atenderá à.
consulta que lhe formulara o algoz de Henriette, em espetáculo, no Anfiteatro,
após ouvi-lo, em ocasião passada, anos atrás...
— Quê? — Gritou o infortunado. —
Então, serei eu, o sabujo que ofereceu ao caçador a pista da destruição da
vítima?
— Sim, meu amigo — afirmou, o
prestimoso Mentor. — Por isso só à Justiça Divina compete os casos da justiça.
Disse Jesus: «Vós julgais segundo a carne (ou a aparência), eu a ninguém
julgo», por conhecer Ele o nosso ontem e as perspectivas do nosso amanhã. Todo
agressor inconsciente cai hoje ou mais tarde nas armadilhas da agressão.
E dando nova entonação à voz, que
mantinha a serenidade habitual, mas que se nos afigurava com expressões de
energia, o irmão Glaucus aduziu:
— Sob carinhosa assistência de
passistas especializados da nossa Esfera, e afastado para tratamento o seu
perseguidor, Ana Maria recobrará forças psíquicas e orgânicas, logo mais,
recuperando-se algo rapidamente. A enfermidade
regridirá em caráter miraculoso e
ela conhecerá um pouco de lenitivo e esperança através do braço amigo de
alguém que, também, se lhe vincula, distendendo na sua direção a aliança
nupcial. Mergulhareis, logo após, o amigo Teofrastus e o vosso cômpar, para, no
longo caminho a percorrer através da experiência carnal, tudo recomeçar,
refazer, regularizar.
— E os meus débitos — interrogou —
como me serão cobrados? Não posso desconhecer a extensão dos meus atos e sei
das consequências que eles devem acarretar.
— Os nossos erros —
referendou o irmão Glaucus — hoje ou mais tarde nos voltam em caráter de
necessária reparação. Adiar o reajustamento significa, também, aumentar os
gravames que o tempo lhes acrescentará, impondo-nos mais elevada dose de
sacrifício. Além disso, não nos cabe a presunção de antecipar o porvir. Entregues
ao Senhor, o Senhor cuidará de nós, abrindo-nos os depósitos do Seu amor e
enriquecendo-nos com as Suas bênçãos múltiplas. Para Ele não há perseguidor nem
perseguido, mas Espíritos enfermos em estados diferentes, caminhando por vias
diversas na direção do Bem Infinito. Não ignoramos que o mal é somente
ausência do bem e que à chegada deste aquele esmaece, porquanto só uma força
existe: a do Amor triunfante!
QUESTÕES PARA ESTUDO E
DIÁLOGO VIRTUAL
1.
Por que os médiuns não recordavam plenamente dos sonhos enquanto vivências de
trabalho no mundo espiritual?
2.
Que tipo de temores Teofrastus teve diante da ideia de renunciar a organização
que pertencia no umbral?
3.
Qual seria o planejamento de reencarnação para Teofrastus?
4.
Como entender a “lepra” que Ana Maria (Henriette-Marie) apresentava?
Um abraço a todos!
Equipe Manoel Philomeno
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