sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Notícia: Crime universitário

MAU GOSTO: Na Poli-USP calouros são pisoteados na lama


A impunidade só aumenta a violência contra os calouros, que ano após ano sofrem humilhações e agressões no primeiro dia de aula. - João Loes e Suzane Frutuoso

O ingresso na universidade já não representa um marco positivo na vida de muitos jovens. O que deveria ser um momento especial de entrosamento com colegas e os primeiros passos numa nova fase tão esperada se transforma num inferno para calouros que são submetidos a trotes agressivos e humilhantes promovidos pelos veteranos. Na semana passada, uma série de barbáries levou estudantes a hospitais devido à violência de pessoas que fazem parte da elite nacional e deveriam se comportar com civilidade. Isso só é recorrente porque os agressores sabem que dificilmente serão punidos, seja pela polícia, seja pelas faculdades que não tomam medidas severas para impedir abusos.
A primeira história que chamou a atenção neste início de ano letivo foi a do vendedor Bruno César Ferreira, 21 anos. Ele entrou em coma alcoólico, na segunda-feira 9, após beber cachaça à força, além de ser agredido durante o trote aplicado por alunos do Centro Universitário Anhanguera, em Leme, interior de São Paulo. "Acreditei que iriam me pintar e raspar minha cabeça", disse Bruno, que sonhava cursar veterinária. O jovem começou a se preocupar quando os veteranos disseram que todos deveriam rolar em fezes e animais em decomposição numa área a 200 metros da faculdade. A situação piorou na hora em que um aluno tentou arrancar uma corrente que Bruno usava. "Reagi dando uma cabeçada nele", conta.
"Daí me amarraram num poste, me socaram, fui sentado em uma cadeira e um deles chutou o pé dela. Caí, bati a cabeça na calçada e não lembro de mais nada." O pai dele, Paulo Ferreira, diz que encontrou o filho inconsciente e sujo no hospital. Dois suspeitos foram identificados.
A faculdade informou que o trote ocorreu fora de suas instalações, mas diz que tomará providências.


CRUELDADE Bruno apanhou e entrou em coma alcoólico

Nesse mesmo dia, Priscilla Rezende Muniz, 18 anos, caloura de análise de sistemas das Faculdades Integradas de Santa Fé do Sul, interior de São Paulo, foi atacada e sofreu queimaduras pelo corpo. Inicialmente, ela foi poupada ao avisar sobre sua gravidez de três meses. Mas uma veterana ameaçou: "Se eu não te pegar hoje, te pego amanhã." Não passou daquela noite. "Ela voltou com um líquido e jogou em mim", contou Priscilla, que teve de ser internada.
"O cheiro era forte, fiquei tonta. Senti a pele queimando." A veterana está foragida. "As queimaduras de segundo grau são lesão corporal dolosa", diz o delegado Gervásio Favaro. Segundo ele, mais pessoas podem ter sido queimadas - o caso de outra caloura de 17 anos foi confirmado.
A faculdade aguarda a conclusão do inquérito para tomar providências. "Só volto para o curso se expulsarem a menina ou me derem proteção",diz Priscilla. Trotes menos violentos, mas igualmente humilhantes, foram sofridos pelos calouros da Escola Politécnica da USP, que rolaram na lama com as roupas rasgadas e foram pisados por colegas e pelos novatos do curso de medicina das Faculdades Integradas Padre Albino, em Catanduva, que tiveram de abaixar as calças no meio da rua.

O que faz o trote regado a estupidez não ter fim entre os universitários? "Os veteranos se apoiam na sensação de não estarem fazendo nada de mais", diz o advogado Guilherme Gantus, de um escritório especializado em responsabilidade civil. "Se a universidade garantir que o aluno será jubilado caso pratique um ato de violência, ele vai moderar os seus atos. Mas é algo que raramente acontece." Se houvesse uma legislação que responsabilizasse a faculdade com processos civis e criminais, os rumos poderiam ser outros. "Hoje, essa lei federal não existe", diz Gantus. Garantindo punição para a universidade, a do aluno também seria certa.
Há dez anos, morreu o calouro Edison Hsueh, mas as circunstâncias nunca foram esclarecidas. Ele foi encontrado morto na piscina da Atlética dos alunos da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), depois que calouros foram obrigados a participar de "caldos" como parte do trote. A Justiça declarou que não havia provas suficientes para sustentar a acusação de homicídio contra os réus. Em Estados como São Paulo e Mato Grosso do Sul há leis que proíbem práticas que ameacem a integridade física dos calouros. Mas não têm mostrado efeito.

"O cheiro era forte, fiquei tonta. Senti a pele queimando" - Priscilla Muniz, que sofreu queimaduras de solvente e gasolina

Uma mistura de sensação de poder e desejo de reconhecimento é o estopim dos abusos, diz o psicólogo Antonio Zuin, professor da Universidade de São Carlos e autor do livro O trote na universidade: passagens de um rito de iniciação. A crueldade vem desde 1342, registro do primeiro episódio com agressões na Universidade de Paris. "O calouro ganha o direito de se vingar no ano seguinte da dor que sentiu", diz Zuin. Há alunos que suportam as humilhações por enxergarem no trote o início de um novo status social. As instituições de ensino superior até se esforçam para combater o problema e muitas incentivam o trote solidário. "Os próprios veteranos propuseram atividades como trabalho voluntário para integrar os novatos", conta Tereza Rodrigues, do serviço de apoio ao estudante da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ainda assim, é comum ver abusos. "Não temos controle do que é feito na rua, mas, quando identificamos os veteranos violentos, punimos", diz ela. Embasadas em depoimentos, fotos e vídeos ou em conclusões de um inquérito policial, as punições vão de uma advertência formal, que fica registrada no histórico escolar, à expulsão.
Hélio Deliberador, vice-reitor da PUC de São Paulo, optou por uma política de contenção de danos, com voluntários distribuindo água, barras de cereal e pipoca na hora do trote para evitar embriaguez. Continua valendo a punição para quem abusa, mesmo fora da instituição. "Estamos de olho nos vídeos e nas fotos postados na internet para identificar exageros", diz. O trote solidário e demais ações que combatem a violência na vida acadêmica são louváveis. Não podem, porém, se tornar apenas paliativos. Melhor que o assunto seja discutido durante o ano todo, entre alunos e professores, para que a tortura não tome o lugar da alegria nos campi.


Fonte: http://www.terra.com.br/istoe/edicoes/2049/artigo125983-1.htm


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COMENTÁRIO:


Rituais de iniciação sempre existiram nas civilizações, algumas são sutis e outras agressivas. Há tribos africanas onde o jovem para se tornar adulto deveria caçar um leão sozinho, no Brasil a menina quando faz 15 anos e vai entrar na vida social, faz uma festa, cujo cerimonial é muito similar a um casamento, dizendo subilimarmente que ela deixou de ser criança, está se tornando uma mulher.
Ao calouros muitas vezes querem passar pelo trote universitário, desta forma são aceitos no grupo, agora deixaram de ser criança e são universitários. Mas alguns trotes extrapolam, são marcados por aspectos de crueldade e demonstram apenas que os veteranos que os executaram ou bolaram possuem uma natureza má. Podemos perceber no trote da Poli-USP a exarcebação do orgulho, onde veteranos andam sobre os corpos sujos dos calouros demonstrando a eles a superioridade dos veteranos.
Infelizmente a lei humana ainda não pune este tipo de agressão, pela dificuldade de encontrar provas e por falha na legislação, mas como espíritos não escaparão do julgamento da consciência, que é sempre justo e certo.
Pelo progresso espiritual do homem e consequentemente da civilização, menos trotes cruéis serão vistos e mais trotes solidários serão realizados, onde se aproveita a oportunidade para ajudar o próximo. O ritual de iniciação da vida universitária, que conhecemos com trote, sempre refletirá a qualidade moral daqueles que o impingem a outros.


Comentário por: Claudia Cardamone, psicóloga e espírita. É membro da Equipe Espiritismo.net, atuando nas áreas de atendimento fraterno e notícias.

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