Livro em estudo: Nos
Bastidores da Obsessão – Editora FEB - 1970
Autor: Espírito Manoel Philomeno
de Miranda, psicografia de Divaldo Pereira Franco
A027 – Cap. 10 – Programação redentora – Segunda Parte
Aqueles conceitos penetravam-nos a
todos, especialmente no Chefe do Anfiteatro, que se mostrava cada vez mais
triste, mais infeliz, não ocultando o sofrimento que o libertava dele mesmo,
escravo das paixões séculos a fio.
Levantando-se, sem a soberbia de
antes, o Dr. Teofrastus arremeteu:
— Mas isto aqui é uma Casa
Espírita! Sou uma das Mentes encarregadas de combater a peçonha cristã, que
teima em reaparecer com indumentária nova. Detestemos esses aventureiros do
corpo, que se atrevem invadir os domínios, que somente pertencem aos mortos.
— Equivocam-vos, amigo —
obtemperou amàvelmente o irmão Glaucus. — Não há mortos, e sim vivos. Encarnados ou desencarnados somos todos
Espíritos imortais, transitando numa ou noutra vibração, marchando, porém, na
direção da imortalidade. O Cristianismo não teima em aparecer ou reaparecer:
não desapareceu nunca, conquanto as interpolações e desrespeitos de que foi
vítima através dos séculos. Refletindo o pensamento do Cristo é a esperança
dos homens e o pão das vidas. Combatê-lo é envenenar-se; persegui-lo significa
dilatar-lhe os horizontes que se perdem nas fronteiras do Sistema Solar. Vã
loucura da ignorância pelejar contra o conhecimento e da estultice investir
contra a sabedoria... Jesus vive e vence, meu amigo. É tudo inútil e vós
sabeis.
— Não o sei — replicou, já
combalido — mas o sinto. Ele me persegue inexoràvelmente. Não me deixa repousar;
tortura-me em cada um a quem torturo; desespera-me em todos aqueles nos quais
descarrego a minha sanha. Que tem Ele contra mim?
— Ou que tendes contra
Ele? — retrucou o Benfeitor. — Jesus é o amor inexaurível: não persegue: ama;
não tortura: renova; não desespera: apascenta! O amigo Teofrastus, sim,
arvorou-se em Seu adversário e sofre as contingências da alucinação e da
procrastinação do momento de entregar-se-lhe em total doação. Não te-mais,
pois. A verdadeira coragem se manifesta, também, quando o ser reconhece o que é
e o que possui, refazendo o caminho por onde deseja seguir, reunindo forças
para retemperar o ânimo, e, qual criança, aprender o amor desde as suas
primeiras lições.
— Temo, sou constrangido a
confessar.
— O temor descende da
consciência em culpa.
— Tenho sido a expressão
da força e da violência e aprendi a não confiar.
— Jesus, porém, é a
expressão do amor e sua não-violência oferece
a confiança que agiganta aqueles que O seguem em extensão de devotamento.
— Temo, porque creio... E
crendo, sofro. Em todo o pelejar, mesmo odiando, nunca O bani da minha mente.
— Nem poderíeis fazê-lo. O
ódio é o amor que enlouqueceu...
— Nos primeiros dias do
século atual fui convocado a abandonar o solo da França para vir aqui operar,
tendo em vista a transformação que se realizava neste país, ante o reverdescér
do pensamento cristão, amortecido em toda a parte e revivente aqui pelo
contacto com a - nossa Esfera de vida. Nosso grupo deveria encarregar-se de
sitiar a mediunidade e os novos cruzados do Cristianismo, instaurando tribunal
de punição e trazendo-os a nossos recintos, quando semidesligados pelo sono,
para que as visões dos nossos cenários e das nossas operações diversas
pudessem infundir-lhes medo ou sedução, deixando nas suas lembranças as
sementes do desejo, no culto do sexo, da ambição, no culto do dinheiro, da
prepotência, no culto da vaidade. Em diversas sessões Espíritas, emissários
nossos têm procurado penetrar, com o objetivo de semear ali a discórdia,
multiplicar as suspeitas, irradiar o azedume e difundir a maledicência... E
quando as circunstâncias facultam, mantemos o comércio pela incorporação sutil
ou violenta, conforme o paladar da leviandade dos membros da Colmeia... Sem
dúvida que temos conseguido boa colheita, principalmente no campo das agressões
morais de vária ordem, em que os falsa-mente bons e os aparentemente honestos
oferecem seminário favorável para as nossas mudas, que logo medram
exuberantes, multiplicando-se facilmente. É evidente que o nosso acesso não se
faz em todos os recintos, porque, alertados, muitos se mantêm em atitude de
vigilância, coibindo-nos a interferência. Além disso, os seguidores do Cordeiro
conseguem dispersar os nossos agentes, utilizando-se de processos muito
eficientes. Como me poderei agasalhar numa Casa que tal? Como me liberarei dos
compromissos com aqueles aos quais me encontro vinculado?
— Ouvimos-vos com atenção
— respondeu o Benfeitor, lúcido e claro. — Embora não fossemos colhidos de
surpresa ante o vosso informe, porque conhecíamos as tarefas do irmão
Teofrastus, elucidamos-vos que esta Casa dispõe de defesas construídas em
muitas décadas de santas realizações, merecendo do Plano Divino carinhosa
assistência. Resguardada das forças agressoras, é agasalho e hospedagem abertos
aos que sofrem, sob a direção do Cristo. Não há porque considerar compromissos
senão com a Verdade. Os outros não podem ser denominados compromissos, mas
conchavos da ignorância, destituídos de qualquer valor, pelos propósitos
infelizes de que se revestem. Nossa destinação, meu amigo, é a Verdade. Como
Jesus é o Caminho, não mais recalcitremos.
Todos nos encontrávamos mergulhados
na mais comovente concentração. O duelo verbal entre a impostura e a verdade
convincente aclarava-nos o espírito, alargando as percepções em torno da
vitória dos altos propósitos e dos superiores desígnios.
A um sinal quase imperceptível, o
irmão Saturnino deixara antes o recinto, atendendo à orientação do Benfeitor
Espiritual.
Naquele momento em que o silêncio se
fizera natural e quando a Entidade meditava, dominada por compreensível
inquietação do espírito em febre, retornou o Guia Amigo, trazendo, adormecida,
qual criança agasalhada no afeto paternal, Ana Maria, que foi colocada carinhosamente
sobre alvo leito, reservado e vazio no recinto, desde o começo da entrevista.
Vendo-a, de inopino, o Dr.
Teofrastus foi acometido de angustiante expectativa. O Benfeitor vigilante acalmou-o
com gesto delicado, após o que se aproximou da jovem adormecida e, tocando-lhe
as têmporas, despertou-a com voz amiga e confortadora.
A leprosa circunvagou o olhar em torno, e, devida-mente acalmada pelo
Instrutor, reconheceu o Dr. Teofrastus. O olhar adquiriu brilho especial,
alongou os braços e, ante a aquiescência do Mentor, o antigo Mago estreitou-a, com imensa ternura,
envolvendo-a em ondas de afetividade e carinho.
— Quanto esperei por este momento! —
aludiu o antigo vingador.
— Também eu, também eu! — retrucou a
sofredora, em lágrimas.
— Perdoa-me, Henriette...
— Perdoar-te? Nosso dorido amor é
maior do que tudo e por si só anula todas as aflições antigas. Sou eu quem te
roga, Teo: ajuda-me e não me abandones mais! Eu sou a esperança quase morta e
tu és o hálito do meu reviver. Não me negues a migalha da tua presença, haja o
que haja. Levantemo-nos do torpor que nos aniquila a longo prazo e roguemos a
Deus que nos resguarde de nós mesmos e nos ajude, a partir de hoje. Não suportaria
mais viver sem ti. Sonho, Teo, isto é um sonho! Estamos numa esfera de sonho em
que me apareces desfigurado e triste. Porque demoraste tanto?
— Perdoa-me! Por mais te buscasse,
jamais reencontrei-te. Não, não nos separaremos mais, nunca mais. Juro!
Renunciarei a tudo, para experimentar a ternura das tuas mãos e a meiguice dos
teus olhos. Ouve, Henriette-Marie, o que te irei falar... Escuta com
atenção...
Não pôde prosseguir. O choro
convulsivo desatou-lhe nalma e ele recuou, vencido, cambaleante, aos gritos, em
atroada desesperadora.
O Mentor amoroso
aproximou-se e exortou-o ao equilíbrio. Falou-lhe da significação do momento e
das poucas reservas que possuía Ana Maria, recém-libertada da constrição
psíquica do seu antagonista e necessitada de estímulo para aceitar os novos
encargos de esposa e não, logo se lhe refizessem os departamentos fisiomentais,
com vistas ao futuro. A palavra oportuna ajudou o atormentado a recompor-se.
Achegando-se à jovem, em espírito, o
irmão Glaucus relatou:
- Filha, hoje tem início
etapa nova na jornada do teu espírito eterno. Embora o passado não esteja
morto, todo ele deve ser esquecido. A construção do amanhã tem início agora.
Sombras e receios, mágoas -e recriminações devem ser superados e a eles se faz
necessário antepor esperança e paz, fé e trabalho na reconstrução da felicidade
que tem demorado. Muitas vezes, ou quase sempre, quanto nos ocorre é
consequência do que realizamos. O nosso teto de albergue deve possuir sem dúvida
segurança e estabilidade para não ruir sobre as nossas cabeças. Longo tem sido
o teu peregrinar e demorado o teu prazo de aflição corretiva. Jesus, porém,
que não deseja a «morte do pecador»,
mas a sua redenção, faculta-nos, a todos, ensejos de resgate luminoso.
Fez uma pausa oportuna. A entidade
acompanhava as palavras felizes do Benfeitor, buscando imprimi-las no imo
dalma. Após breve silêncio, este prosseguiu:
— O teu sonho de amor, esperado por
largo período de tempo, que agora já passou, se concretizará... O nosso
Teofrastus necessita, também, de recomeçar a experiência, a benefício dele
mesmo. Entre ambos, porém, medeia o impedimento dos estados em que permanecem.
Enquanto, filha, jornadeias no corpo carnal, o nosso amigo se encontra
libertado dos fluídos fisiológicos. Ante, pois, a impossibilidade de uma
comunhão matrimonial que a vida lhes não pode oferecer de momento, solicitamos
que lhe ofertes a intimidade orgânica para que ele recomece o caminho, na
condição de filho da tua devoção e do teu carinho...
Ana Maria, sacudida por impulso
inesperado, ajoelhou-se e, abrindo os braços, balbuciou:
— Que se faça a vontade de Deus!
O irmão Glaucus,
utilizando-se da expressiva ocasião, prosseguiu:
— Tu, porém, filha,
deverás oferecer ensejo a outro ser que ama e padece, esperando compreensão e
piedade. Trata-se de Jean Villemain, o infeliz sacerdote que, no pretérito, desencadeou
todas estas aflições...
— A ele, eu me recuso
ajudar —, replicou a jovem. — Odeio-o com todas as forças. Como lhe poderia
ser mãe?
— O ódio, filha —
considerou o Benfeitor —, somente desaparece na pira do sacrifício do amor. É
certo que ele te fez sofrer em demasia; no entanto, a tua felicidade que agora
tem início é, de certo modo, facultada porque ele te libera dos vínculos da
rebeldia com os quais se ata a ti. Afastado para tratamento, sentirás o
benefício da saúde e da paz em retorno. Negar-lhe-ás a sublime oferta do
recomeço, que a ti a Misericórdia Divina, por sua vez, está concedendo? O teu
seio, transformado em santuário maternal, receberá o amigo e o adversário e os
terás como filhos diletos na forja do lar, sofrendo e amando, ajudando-os
recíprocamente para que transformem os floretes do duelo em arados do amanho
ao solo da esperança, em cujos sulcos sejam depositadas as sementes da paz.
A voz do Instrutor traía a emoção
que o visitava. Como se recordasse serem os homens da Terra todos vítimas das
paixões dissolventes, retomou a palavra e acentuou:
— Jesus, embora nossa
ingratidão, continua amando-nos. Quando na Cruz, conquanto escarnecido, esteve
amando, e agora, apesar de propositadamente ignorado por milhões de seres,
prossegue amando. Sigamos-Lhe, filha, o exemplo, e transformemo-nos em célula
de amor, a fim de que as nossas construções se assentem em alicerces de
segurança.
Ana Maria, em lágrimas, fitou o
antigo afeto, que permanecia atoleimado, e, inspirada pelas forças superiores
que saturavam o recinto, concordou:
— Se o meu amor pode beneficiar o Teo
e a minha recusa a Jean pode ser fator de insucesso, em homenagem ao Amor de
todos os Amores, aceito-o, também, como filho, e que Deus tenha piedade de
nós...
O irmão Glaucus enlaçou a jovem
mulher em terno abraço, e, tomando o Dr. Teofrastus no mesmo envolvente gesto,
rogou ao Senhor que os abençoasse, felicitando-os com a concessão da união
espiritual.
A jovem foi reconduzida de volta ao
corpo, no Lazareto.
Depois de mais alguns estudos sobre
a nova condição do irmão Teofrastus, este aproximou-se da porta e despediu os
dois guardas, ficando combinado que ele se demoraria naquela Casa sob os
auspícios dos Instrütores, até o momento em que seria encaminhado a uma Colônia
preparatória para. a reencarnação futura, mesmo porque outros trâmites no
processo da desobsessão de Mariana requereriam sua presença.
Ante os sucessos daquela madrugada,
o irmão Glaucus, sensivelmente comovido, orou a Jesus, em gratidão, e os trabalhos
foram encerrados, depois do que, fomos reconduzidos ao lar.
QUESTÕES PARA ESTUDO E
DIÁLOGO VIRTUAL
1.
Como podemos entender a presença de Jesus junto a Teofrastus que perseguia
centros espíritas?
2.
Como Teofrastus em sua organização atuava junto a casa espírita?
3.
Ana Maria receberia como filhos tanto Teofrastus que amou, como um antigo
perseguidor. Qual a importância da família para a redenção do Espírito imortal
de acordo com a Doutrina Espírita?
Um abraço a todos!
Equipe Manoel Philomeno
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